Francisco Agatão: “O Lidador”. Um bejense nostálgico, lutador e solidário.
Uma entrevista com 12 anos, mas actual. “O Lidador”, como Agatão foi definido, é hoje o nome deste site dedicado à luta e à solidariedade. Num dia de dor, uma recordação que é um reconhecimento.
FRANCISCO AGATÃO (Treinador de Futebol). No Operário, “O Lidador”. Um bejense nostálgico, lutador e solidário
Sabe o que é comer o pão que o diabo amassou. Nasceu, brincou e foi criado no Terreirinho das Peças (Beja). Deu os primeiros pontapés na bola na Zona Azul, porque “o meu CHORIA -o PAI- abriu uma exceção”, a pedido de dois homens (Quinito e Zé Manel). Na Zona Azul lavou camisolas, calções e meias por cinco contos, aprendeu a “Lei da Vida”. No “emprego” do Desportivo de Beja, carregou sacos de trigo nos armazéns da EPAC.
Humilde, amigo do amigo, e eles, tratam-no, não por Chico, nem por Agatão, mas por “Pápa”. Por onde passou deixou amigos, alguns “ligam-lhe” semanalmente, mas o seu melhor amigo, o Choria, esse “partiu” há muito, mas, fala com ele todos os dias (n.d.r.: Rosalina, a mãe faleceu na noite do passado dia 31 de Março).
No cante alentejano e no Hino dos Mineiros encontrou um alento para as vitórias, tem um sonho, e tal como Gonçalo Mendes da Maia, há de ser, “O Lidador”. ACRESCENTO: Foi “O Lidador” nos Açores e no Operário.
Que definição faz de si como homem ?
Dos sete irmãos fui aquele que tive mais sorte, com a felicidade de ter nascido num tempo diferente, face às dificuldades que os meus pais tiveram em termos económicos para poder cuidar de tanta “maralha”. Fui o último a sair de casa, acompanhei os melhores anos da sua vida, até à velhice e acabei por ser o que tive mais sorte. A vida acabou por me sorrir, sobretudo no futebol, a profissão que eu escolhi e que me surgiu na altura. Se bem que nesse aspecto o Pálico era o que tinha melhores condições para tal.
Como jogador, como é que o Chico “viu” o Agatão ?
Fui sempre um jogador de equipa. Jogava numa posição de trinco, tinha que ter uma boa leitura e uma boa capacidade de organização táctica e de jogo. Pensando um pouco, terei passado ao lado de uma excelente carreira, mas, como profissional limitei-me a cumprir as obrigações dos meus treinadores. Realizei perto de 200 jogos na 1ª divisão e jogos internacionais. Pelos clubes por onde passei, Boavista e Estrela da Amadora, julgo que honrei o nome da família e de Beja.
Representar os três clubes de Beja, Desportivo, Despertar e Zona Azul, não esteve ao alcance de toda a agente ?
Em qualquer deles consegui o título de Campeão Distrital, e olhando para traz sinto-me orgulhoso por esse facto, que na verdade, pelas vicissitudes dos clubes, nem toda a gente pode ostentar.
Beja, Elvas (Badajoz à vista), Boavista. Uma carreira à base do B ?
Levei algum tempo a decidir-me a sair de Beja, o sentimento foi sempre mais forte, o que acontece ainda hoje. Sobretudo por causa dos meus pais, porque fui o último a sair, e de alguma forma era o suporte daquela família. Tive a felicidade de ter saído para “O Elvas”, e com trabalho, dedicação e humildade, cheguei ao Boavista que acabou por ser o ponto principal da carreira. Fui o único alentejano que joguei no clube do Bessa, o nome faz parte da sua história e isso, naturalmente, engrandece-me.
Treinador, porquê ?
No Estrela tive um problema disciplinar num jogo em Chaves e tinha a carreira em suspenso. O Carlos Manuel, treinador do Estoril, convidou-me para lá jogar e no final dessa época convidou-me para adjunto, e já lá vão sete anos. Pode-se dizer que é a fase inicial de uma carreira, onde já aconteceu de tudo e ser treinador do Sporting foi o melhor, que não está ao alcance de qualquer um.
Quem o conhece, diz de si que é “um adjunto de primeira”. Concorda com essa definição ?
Tenho o privilégio de trabalhar com um homem que me dá liberdade de acção e como adjunto tenho uma disponibilidade total para com o Carlos Manuel. Correspondo de acordo com a exigência profissional, pelo que não me sinto um treinador adjunto.
Já pensou numa carreira a só. É uma ainda não amadurecida ?
É a palavra certa, não está amadurecida. Até ao momento não pensei dessa maneira, sobretudo pelo aspecto sentimental, e tenho para com o Carlos Manuel em sentimento de solidariedade muito grande. Este não é o momento ideal, não queria deixá-lo numa altura em que estamos sem trabalho.
Que faz um treinador, quando está desempregado ?
Vejo jogos, mantenho-me actualizado, porque a qualquer momento pode surgir trabalho, o que nesta altura tem levado mais tempo, mas, é a vida de treinador. Como hobby ? É a pesca que me ocupa grande parte dos meus momentos de ósseo.
Defina, de forma breve, os melhores momentos da sua vida ?
Juventude: A Zona Azul, ensinou-me a ser homem, a ser jogador, a ser solidário, aspectos da vida que ainda hoje me marcam. O Desportivo por ter chegado à 2ª divisão com 19 anos.
Jogador: Ter ingressado no Boavista. Com 25 anos fui titular.
Treinador: Ser treinador do Sporting, apesar da amargura de alguns momentos. Mas o Salgueiros está-me no coração.
Pesca: O mar em Lagos. Já lá tirei bons peixes.
Obs: Esta entrevista foi publicada em 2003 no jornal “Alentejo Popular” editado em Beja. Na altura desempregado e à espera de continuar a trabalhar com Carlos Manuel. Alguns meses depois e amadurecida a tal ideia, é treinador principal. Em respeito ao Operário, clube que encontrou nele um “Lid(ador)er”, e ao Agatão, foi em São Miguel o “Pápa”. O destino tem destas coisas e actualmente Agatão é treinador do Mineiro Aljustrelense, onde o “Hino dos Mineiros” cala mais fundo. Tudo o que na altura foi dito e escrito, há 12 anos, está actual. Porque afinal, os Homens existem…..