Opinião (José Lúcio/ Juiz): Um feliz ano de 2019 para a Justiça ?


Na sua recente intervenção na cerimónia de abertura do novo ano judicial o senhor Presidente do Supremo Tribunal de Justiça fez questão de sublinhar que o ano de 2018, ora findo, foi um ano globalmente positivo para a Justiça.

José Lúcio

Juiz Presidente da Comarca de Beja

Foi positivo no plano dos princípios que regem o sistema, onde continuamos a ter uma justiça independente como poucas se encontram no vasto mundo, e no plano da eficiência, podendo referir-se por exemplo que entraram nos tribunais 437.554 processos e findaram 563.929, com tempos médios de pendência cada vez mais reduzidos.

O número de processos findos só por si constitui um indicador impressionante sobre a dimensão da máquina judiciária e sobre a sua capacidade de resposta.

O mesmo se pode dizer das observações da senhora Ministra da Justiça sobre a continuada melhoria ao nível das pendências globais: o número total dos processos pendentes nos nossos tribunais judiciais de primeira instância já chegou a ultrapassar um milhão e seiscentos mil, pelo que a sua redução para o patamar dos novecentos mil significa trazer essa pendência para o mínimo deste século.

Infelizmente estes destaques da sessão solene de abertura do ano judicial não puderam chegar ao grande público. A cobertura noticiosa preferiu centrar-se naquelas passagens dos discursos dos intervenientes que, dando conta de insatisfações ou reparos, podiam harmonizar-se com a imagem negativa da Justiça que está instituída como narrativa obrigatória.

Nada de novo: como começou por realçar o senhor Presidente do STJ, “estamos habituados a ver a justiça envolvida num turbilhão mediático em que, muitas vezes, de forma expressa ou implícita, as referências comuns são as da lentidão, da ineficácia, da irrazoabilidade das decisões ou toda a sorte de outras considerações menos abonatórias.” E as boas notícias nunca são notícia…

            O que desejar então para 2019? Em primeiro lugar, que os tribunais possam continuar a trabalhar com independência e com a necessária dignidade de forma a acentuar os aspectos positivos dos anos que passaram e a ultrapassar os constrangimentos com que se confrontam na sua laboração diária.

Para tal será necessária a convergência de vontades e o contributo de todos os poderes do Estado, eliminando-se definitivamente desconfianças e atritos que a todos diminuem. A existência de um Poder Judiciário enfraquecido e desprestigiado não contribui, ao contrário do que podem pensar analistas apressados, para o fortalecimento e prestígio institucional dos restantes poderes do Estado.

E o que esperar para 2019? Sem dúvida, muito trabalho – e problemas acrescidos nos pontos críticos já identificados.

Esses pontos críticos reduzem-se essencialmente a dois.

Por um lado a dificuldade em enfrentar aqueles processos, poucos em número mas pesadamente dominantes em termos de impacto público, que para muitos serão o único instrumento de avaliação do desempenho da Justiça.

Por outro lado, a necessidade de ultrapassar o défice comunicacional que afecta decisivamente o relacionamento entre a Justiça e a sociedade e por essa via superar imagens e narrativas generalizadas que penalizam injustamente todos aqueles que, com inegável espírito de serviço, a ela dedicam o melhor das suas vidas.

No final teremos que fazer o balanço. Para já, vamos ao trabalho.

(Texto escrito segundo a norma ortográfica anterior ao AO1990, por opção do autor)


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