Opinião (Rogério Copeto): IN MEMORIAM


Faz dia 23 de junho, precisamente um ano, que uma estrada do distrito de Évora tirou a vida à Guarda Principal Maria João Moura e ao Guarda Principal António Godinho, quando cumpriam a mui nobre missão da Guarda Nacional Republicana, servindo este texto para assinalar o 1º aniversário da sua morte e homenagear dois grandes militares e excelentes seres humanos, que fazemos questão de nunca esquecer.

Roger Copeto_800x800Rogério Copeto

Tenente-Coronel da GNR, Mestre em Direito e Segurança e Auditor de Segurança Interna

Chefe da Divisão de Ensino/

A Guarda Principal Maria João Moura e o Guarda Principal António Godinho faleceram vitimas de um acidente de viação, quando se deslocavam de Évora para Reguengos de Monsaraz pela na EN nº 256, pelas 16h18 do dia 23 de junho de 2014, depois de terem entregue, na sede de Agrupamento de Exames em Évora, os exames nacionais de matemática do 9º ano, realizados de manhã nas escolas que tinham à sua responsabilidade no âmbito da operação de segurança aos exames nacionais “Operação Açor”.

A Maria João Moura entrou para a GNR no ano de 1999 e no ano seguinte entrou o António Godinho, ambos nascidos no distrito de Évora, tendo sido no Alentejo que começaram a dar cumprimento ao lema da GNR “ Pela Lei e Pela Grei”.

Cedo relevaram perfil para integrarem o Núcleo Escola Segura do Destacamento Territorial de Reguengos de Monsaraz, que acabariam por integrar, primeiro a Guarda Principal Maria João em 2002 e o Guarda Principal Godinho em 2005, tendo ambos desde logo conseguido granjear o carinho e a amizade de toda a comunidade escolar, devido ao empenho que dedicavam em prol da segurança dos mais novos.

Paralelamente ao trabalho que desenvolviam no Programa “Escola Segura” iam realizando actividades direccionadas para os mais idosos, no âmbito do programa “Idosos em Segurança”.

Assim, foi com naturalidade que a Guarda Principal Maria João e o Guarda Principal Godinho tiveram a ideia de juntar nas actividades por si realizadas, duas gerações, as crianças com quem trabalhavam no âmbito do Programa “Escola Segura” e os idosos do Programa “Idosos em Segurança”, num projecto que denominaram de “Gerações de Mãos Dadas”.

O Projeto “Gerações de Mãos Dadas” nasceu então em 2011, com o objectivo de permitir a participação social e o envolvimento da comunidade mais nova com os mais velhos, fomentando a comunicação, interação, partilha de conhecimentos e experiências e a solidariedade entre as crianças e idosos sob o lema “Ninguém é tão novo que não possa ensinar e ninguém é tão velho que não possa aprender”.

O “pai” e a “mãe” do Projecto “Gerações de Mãos Dadas” apresentaram-no ao seu Comandante, Capitão Vitor Ribeiro, que o acarinhou e implementou na área do seu Destacamento, tendo elaborado um relatório dando conta dos objectivos do projeto e dos resultados alcançados, que remeteu para o seu Comandante Territorial, tendo o Relatório chegado ao Comando-Geral da GNR.

O Comandante-Geral da GNR, ao ter conhecimento do projecto em julho de 2012, não só o considerou como boa prática, como determinou a sua divulgação por todo o dispositivo, tendo no dia 1 de outubro de 2012, para assinalar o “Dia Internacional do Idoso”, sido realizadas 184 ações, que empenharam 403 militares e abrangeram 5.036 idosos e 4.751 crianças.

Também por decisão do Comandante-Geral, a GNR apresentou o Projeto “Gerações de Mãos Dadas” à 3ª edição do “Prémio Manuel António da Mota”, juntamente com mais 180 instituições, cujo tema do prémio foi no ano de 2012 subordinado ao “Ano Europeu do Envelhecimento Ativo e da Solidariedade entre Gerações” (AEEASG).

Todas as candidaturas foram submetidas a uma primeira avaliação, tendo o Projeto “Gerações de Mãos Dadas” do Destacamento Territorial de Reguengos de Monsaraz, sido seleccionado pelo Júri, para integrar os dez finalistas, facto que só por si foi sinónimo de enorme prestigio para GNR, e claro, de enorme alegria para os “pais” do projecto.

As dez candidaturas finalistas foram todas apreciadas in loco, conduzida por, pelo menos, um dos membros que integraram o Júri, conforme previsto no respetivo regulamento do prémio.

O membro do Júri que se deslocou a Reguengos de Monsaraz foi a Drª Joaquina Madeira, Coordenadora do AEEASG, que no final da avaliação referiu “… que o projeto da GNR é um exemplo de originalidade em Portugal e na Europa, não se conhecendo outra Força de Segurança que desenvolva semelhante actividade”.

A avaliação do Projeto “Gerações de Mãos dadas” no terreno foi acompanhada também pela TSF, que realizou uma reportagem com o título “Vou avisar os meus avós[1], da autoria dos jornalistas Alexandrina Guerreiro, Herlander Rui e Nuno Amaral, que resumiram do seguinte modo o Projeto: “A cavalo ou de jipe, os guardas da GNR de Reguengos de Monsaraz levam conselhos e sorrisos a idosos que vivem em montes isolados no imenso Alentejo. Sempre que o calendário escolar permite, alunos do primeiro ciclo vestem a farda e acompanham os militares. Em lares de terceira idade ou na planície alentejana alertam contra burlões e deixam sorrisos no combate à solidão.”

A cerimónia para entrega do prémio, foi marcada para o dia 16 de dezembro de 2012 no Palácio da Bolsa no Porto, tendo sido convidados representações das 10 instituições finalistas, cabendo aos “pais” do projecto representar a GNR na Cerimónia que foi presidida pelo Exmº Ministro da Solidariedade e Segurança Social, Dr. Pedro Mota Soares, que no final confidenciou ter acompanhado com especial interesse as atividades desenvolvidas pela GNR no âmbito do AEEASG.

No final da cerimónia apesar da candidatura da GNR não ter ganho o primeiro lugar, recebeu das mãos do Presidente do Conselho de Administração da Mota-Engil, SPPS, Dr. António Mota, uma menção honrosa e um prémio pecuniário no valor de 5.000 euros, bem como os maiores elogios de todos as outras instituições e membros do júri, provocando na Guarda Principal Maria João e no Guarda Principal Godinho uma enorme alegria, por verem o seu trabalho reconhecido, não só internamente pela GNR, mas também pela sociedade civil.

Esse reconhecimento foi também feito pelo actual Comandante do Comando Territorial de Évora, Coronel Pedro Miguel Ramos Costa Lima, que em abril de 2014, por proposta do então Comandante do Destacamento Territorial de Reguengos de Monsaraz, Capitão Vitor Ribeiro, louvou individualmente ambos os militares.

Do texto do louvor atribuído à Guarda Principal Maria João e ao Guarda Principal Godinho, consta o reconhecimento pelo trabalho desenvolvido no Projeto “Gerações de Mãos Dadas”, sendo também realçadas as “…elevadas qualidades humanas, elevada dedicação ao serviço, invulgar sentido do dever e da responsabilidade, aptidão para bem servir e sensatez no desempenho das diversas missões e tarefas que lhe têm sido confiadas”. Ambos os Louvores dão ainda conta do contributo da Guarda Principal Maria João e do Guarda Principal Godinho para o prestígio da GNR, quer devido ao excelente e cordial relacionamento com as populações, nomeadamente a população mais idosa e a comunidade educativa, quer na contribuição para os elevados resultados obtidos na actividade diária desenvolvida pelos dois.

São lembradas também as características de personalidade que ambos possuíam e que eram por todos reconhecidas, tais como as elevadas competências profissionais, coragem, espirito de obediência, sólida formação moral, correção, nobreza de caracter e sentido de abnegação.

Os louvores com que a Guarda Principal Maria João e o Guarda Principal Godinho foram agraciados são o reconhecimento da GNR pelo que fizeram enquanto militares da GNR, encontrando-se os mesmos arquivados nos processos individuais de cada um, mas outros reconhecimentos, não se encontram arquivados em lado nenhum, senão na nossa memória, e esses reconhecimentos são os milhares de agradecimentos e elogios que recebiam todos os dias de centenas de crianças e de idosos, que viam na Maria João e no Godinho os seus “Anjos da Guarda”.

Ambos pautaram, tanto a sua vida profissional, como a sua vida pessoal no fazer o bem e em dar o seu modesto contributo para melhorar a qualidade de vida das pessoas, com quem se relacionavam, especialmente os mais frágeis.

No cumprimento da missão da GNR, foram milhares e milhares os quilómetros que a Guarda Principal Maria João e o Guarda Principal Godinho fizeram nas estradas do distrito de Évora, a caminho das escolas, dos montes isolados, dos lares de terceira idade e das dezenas de instituições com quem a GNR se relaciona e sempre em prol das populações mais vulneráveis, como as crianças e os idosos.

Fisicamente a Guarda Principal Maria João e o Guarda Principal Godinho deixaram de estar entre nós, mas devido às marcas que deixaram nos seus familiares, nos seus amigos, nos seus camaradas, superiores hierárquicos, autarcas, professores, técnicos e toda a população que serviam, do mais anónimo ao menos, especialmente as crianças e os idosos, não será possível esquece-los, sobretudo a sua alegria de viver e o profissionalismo que colocaram em tudo o que faziam

A Guarda Principal Maria João e o Guarda Principal Godinho foram e serão um exemplo a seguir por todos nós, e fazem agora parte daqueles que por obras valerosas se libertaram da lei da morte.

[1]  http://www.tsf.pt/Programas/programa.aspx?content_id=2550928&audio_id=2906678

 


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