Opinião (Rogério Copeto/ Oficial da GNR): COMPORTAMENTOS ADITIVOS NA POPULAÇÃO ESTUDANTE.


O presente artigo foi elaborado em resposta ao desafio lançado por um camarada, que me sugeriu abordar no LN, o tema dos comportamentos aditivos dos nossos jovens alunos, tendo em conta a sua experiência como cidadão e como oficial da GNR, preocupando-o especialmente o consumo de canábis, por parte da população estudante.

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Rogério Copeto

Tenente-Coronel da GNR

Mestre em Direito e Segurança e Auditor de Segurança Interna

Chefe da Divisão de Ensino/ Comando de Doutrina e Formação

Para falar neste assunto, nada melhor, do que o diretor do Serviço de Intervenção nos Comportamentos Aditivos e nas Dependências (SICAD), João Goulão, que deu ao Expresso uma entrevista, publicada na edição de 24 de setembro, com o título “Há uma enorme tolerância sobre o consumo da canábis”.

Conforme o título da entrevista dá a entender, o consumo de canábis por parte dos nossos jovens alunos, preocupa o director do SICAD, referindo que, “tivemos uma situação mais ou menos calamitosa com o consumo da heroína. Grande parte do dispositivo que foi montado foi eficaz no enfrentar desse fenómeno, mas relativizou a importância dos produtos derivados da canábis. Nunca tivemos um discurso que incidisse sobre os efeitos desta droga.

Mas a entrevista não aborda só o problema do consumo de canábis por parte da pulação estudante, tendo como mote o Relatório denominado “European School Survey Project on Alcohol and other Drugs (ESPAD)”, que apresenta os resultados da 6ª recolha de dados realizada na europa, em 2015 e assinala o 20º aniversário da 1ª recolha de dados efectuada em 1995, tendo sido aplicados 96.043 questionários a estudantes de 35 países europeus, sendo 24 Estados-Membros da União Europeia (UE), cuja totalidade abrangida durante os últimos 20 anos já atingiram os 600.000 estudantes, tornando o ESPAD a mais extensa recolha de dados realizada sobre o consumo de álcool, de tabaco e de estupefacientes por jovens na Europa.

Este assunto dos comportamentos aditivos já aqui foi abordado, no artigo denominado “Férias, finalistas, consumos, GNR e Michael Moore”, onde demos a conhecer o trabalho dos militares dos Núcleos de Escola Segura (NES) que desenvolvem junto das comunidades escolares, com o objectivo de fazer com que as escolas se constituam como locais seguros e tendencialmente livres de drogas.

A tarefa dos NES é essencialmente preventiva, dissuasora e pedagógica, realizando nas escolas à sua responsabilidade, diversas acções de informação sobre os consumos aditivos, sendo a acção de maior visibilidade a “Operação Spring Break”, com o objectivo de prevenir os comportamentos de risco inerentes ao consumo de droga e álcool, durante as viagens de finalistas, realizadas nas férias da Páscoa pelos alunos finalista do secundário.

Também tivemos oportunidade de referir que a chamada “Lei da Descriminalização” (Lei 30/2000 de 29 de novembro), fez com que Portugal fosse incluído no restrito lote de países onde o consumo de drogas não é crime, tendo o “Modelo Português”, se constituído como um exemplo a seguir, no que diz respeito ao combate ao tráfico e consumo de estupefacientes e substâncias psicotrópicas, levando o realizador americano Michael Moore no seu mais recente filme denominado “Where to Invade Next” indicado Portugal como um exemplo a seguir pelos EUA, no que toca à descriminalização do consumo de drogas.

Depois deste aparte, voltamos ao ESPAD para referir que foi iniciado em 1995 devido à falta de dados comparáveis sobre o uso de substâncias entre os adolescentes europeus, tendo por isso como objectivo proceder à recolha de dados sobre o consumo de substâncias aditivas, pelos estudantes de 15 e 16 anos de idade, no maior número de países europeus possível, repetindo o estudo a cada quatro anos, tendo o ano de 1995 como ponto de partida.

No que diz respeito às conclusões referentes a Portugal, importa referir que das oito principais variáveisestudadas: Consumo de tabaco nos últimos 30 dias; Consumo de álcool nos últimos 30 dias; Consumo num único episódio de cinco ou mais bebidas, nos últimos 30 dias; Se já consumiu cannabis (marijuana ou haxixe); Se já consumiu outras drogas ilícitas, que não a cannabis (ecstasy, anfetaminas, cocaína, crack, LSD ou outros alucinógenos e GHB);Se já consumiu tranquilizantes ou sedativos sem receita médica; Se já inalou alguma substância com a intenção de ficar “pedrado”; Se já consumiu novas substâncias psicoactivas (ver gráfico), os estudantes portugueses obtiveram registos mais baixos ou em linha com a média dos países estudos, em todas as variáveis.

A diferença mais marcante foi a registada no consumo num único episódio de cinco ou mais bebidas, nos últimos 30 dias, tendo sido relatado por apenas 20% dos alunos portugueses, em comparação com a média de 35%, assim como o consumo de álcool nos últimos 30 dias, que registou um valor de 42%, abaixo da média global, que é de 48%. Ainda abaixo da média está a inalação de substâncias para ficar “pedrado” e o consumo de substâncias psicoactivas. Os registos que se encontram dentro da média, são o consumo de tabaco nos últimos 30 dias, o consumo de inalantes, o consumo de cannabis, o consumo de outras drogas, que não a cannabis e o consumo de tranquilizantes ou sedativos sem receita, concluindo-se que os alunos portugueses relatam um menor consumo de substâncias aditivas do que os restantes alunos dos países estudados no ESPAD.

Sobre estas conclusões, aparentemente positivas, transcrevemos as palavras do director do SICAD, onde refere que “as causas que conduzem aos consumos são multifatoriais e as que conduzem à sua redução também. Foram tomadas várias medidas no sentido da redução da oferta, como o aumento da idade legal para os 18 anos no caso do álcool e as restrições nos locais onde se pode fumar. Também não sabemos em que medida a crise financeira e a diminuição do poder de compra afetou. Depois há modas e tendências que nos ultrapassam. Neste mundo muito globalizado, há consumos que sobem e descem no contexto europeu e nós andamos ali na média. Também queremos crer que o trabalho preventivo junto dos jovens tem resultado.”

Terminamos com a divulgação do evento denominado “Encontro ‘Descriminalização 15 anos depois’”, que irá decorrer nos dias 8 e 9 de novembro de 2016, no Auditório da Biblioteca Municipal Almeida Garrett, no Porto, e tem como objectivo assinalar o 15º aniversário da entrada em vigor da Lei 30/2000 de 29 de Novembro e dar a conhecer o sucesso do “Modelo Português”, não nos podendo esquecer, que para o sucesso deste modelo, também muito contribuem as Comissões para a Dissuasão da Toxicodependência (CDT), que celebraram no passado dia 1 de julho, 15 anos de existência, e que para o cumprimento da sua missão, de promover a dissuasão do consumo de substâncias psicoativas, contam com a parceria, insubstituível, da GNR e da PSP, constituindo-se assim as CDT como um serviço ímpar, de referência nacional e internacional, na operacionalização da “Lei da descriminalização”, cujo maior esforço, gostaríamos que fosse dedicado a erradicar o consumo de canábis na nossa população estudante.


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