Opinião (Rogério Copeto/ Oficial GNR): BOAS PRÁTICAS DE COMBATE AO VERLT.
A sigla VERLT significa “Violent Extremism and Radicalisation Leading to Terrorism”, e com o presente artigo pretendemos dar a conhecer quais as boas práticas existentes no âmbito do Policiamento de Proximidade/Comunitário de combate à radicalização conducente à adoção de ideologias assentes no extremismo violento, como o terrorismo.
Tenente-Coronel da GNR
Mestre em Direito e Segurança e Auditor de Segurança Interna
Chefe da Divisão de Ensino/ Comando de Doutrina e Formação
O documento da OSCE (Organization for Security and Co-operation in Europe), denominado “Countering Violent Extremism and Radicalisation that Lead to Terrorism: Ideas, Recommendations, and Good Practices from the OSCE Region”, datado de 28 de setembro de 2017 e da autoria do Professor Peter R. Neumann, do International Centre for the Study of Radicalisation, do King’s College London, contém 22 estudos de caso e boas práticas, sobre diversas áreas, sendo nossa intenção dar a conhecer aquelas que se reportam ao Policiamento de Proximidade/Comunitário, cujo assunto foi anteriormente abordado, também pela OSCE, no documento denominado “Preventing Terrorism and Countering Violent Extremism and Radicalization that Lead to Terrorism: A Community-Policing Approach”, datado de fevereiro de 2014.
Assim, no que diz respeito às atividades desenvolvidas pelas Forças de Segurança (FS), como são o caso da GNR e da PSP, enquanto principais responsáveis pelo combate ao terrorismo, o Policiamento de Proximidade/Comunitário desenvolvido por ambas as FS poderá contribuir positivamente para combater a radicalização conducente à adoção de ideologias assentes no extremismo violento, como o terrorismo, no nosso país.
A OSCE define a radicalização como um processo através do qual grupos ou indivíduos passam por uma transformação psicológica que os conduz ao apoio de ideologias políticas, sociais e religiosas extremas e que por si só não pode ser considerada uma ameaça à sociedade, podendo até ser uma força benéfica para a mudança, como por exemplo os ativistas a favor dos direitos humanos ou da abolição da escravatura, só podendo ser tratada como um ato ilícito ou ilegal, quando a radicalização se torna violenta.
Por outro lado, o extremismo violento é a assunção e defesa de crenças, atitudes, políticas ou sentimentos que não sejam consideradas como aceites por uma maioria da sociedade e que advoguem o uso ilegítimo da força.
Tendo em conta o exposto anteriormente, nomeadamente que a radicalização não deve ser tratada como um ato ilícito ou ilegal, conclui-se que as FS através do Policiamento de Proximidade/Comunitário têm à sua disposição uma das formas mais eficazes para combater o extremismo violento, tendo em conta que este tipo de policiamento tem como objetivo tornar as comunidades mais seguras, contribuindo para que as FS sejam vistas como figuras de autoridade próximas, que aparecem sempre que há problemas, fazendo por isso parte das comunidades que servem, construindo relacionamentos e assim ganhando a confiança de todos os cidadãos.
Este tipo de policiamento assume especial importância nas comunidades que tradicionalmente são mais resistentes e desconfiadas da autoridade do Estado, pelo que os resultados esperados, da implementação do Policiamento de Proximidade/Comunitário, são uma maior resiliência da comunidade a ideologias extremistas, logo, menos suscetíveis de serem radicalizadas e recrutadas para o terrorismo.
Na prática, o Policiamento de Proximidade/Comunitário como instrumento de combate ao VERLT resume-se a três princípios fundamentais: – Ênfase nas parcerias com organizações comunitárias e respetivos líderes, incluindo jovens, mulheres, grupos religiosos e minorias étnicas, bem como empresas e outras instituições da sociedade civil, que as FS devem procurar envolver, na construção de um relacionamento de confiança e de proximidade; – A resolução de problemas, implicando que as FS devem ouvir as comunidades e responder às suas preocupações e necessidades, mesmo quando não estão no topo das suas prioridades, e; – O Policiamento de Proximidade/Comunitário deve ser proativo e preventivo, procurando mobilizar as pessoas para a resolução do problema, antes que evolua e se transforme em crime.
Estudos como o documento da autoria do National Institute of Justice do EUA, denominado “The Challenge and Promise of using Community Policing Strategies to Prevent Violent Extremism: A Call for Community Partnerships with Law Enforcement to Enhance Public Safety”, datado de janeiro de 2016, demostram que o Policiamento de Proximidade/Comunitário pode ser eficaz para aumentar a confiança dos cidadãos nas FS, sendo por isso um importante contributo no combate ao extremismo violento e na contra-radicalização.
No entanto as FS não devem ser os únicos com responsabilidades na implementação de programas de contra-radicalização, porque isso pode diminuir a sua autoridade e levar a alegações de que o Policiamento de Proximidade/Comunitário implementado como medida de combate ao extremismo violento e da radicalização é, efetivamente, um “programa de espionagem”, servindo unicamente para a recolha de informação (inteligence).
Como exemplo da aplicabilidade do Policiamento de Proximidade/Comunitário no combate ao VERLT, o relatório apresenta como boa prática, o exemplo do Los Angeles Police Department (LAPD), cuja avaliação pode ser consultada em: “Community Policing to Counter Violent Extremism: A Process Evaluation in Los Angeles”, da autoria do National Consortium for the Study of Terrorism and Responses to Terrorism (START), do Department of Homeland Security Science and Technology Center of Excellence Led, da University of Maryland, datado de julho de 2017.
Esta boa prática do LAPD implementada em 2008 consistiu na criação de uma seção especializada, direcionada para a comunidade, dentro do “Counter-Terrorism and Special Operations Bureau”, composta por 25 agentes policiais, tendo esta subunidade criado um extenso programa para envolver as comunidades muçulmanas em assuntos relacionadas com o extremismo violento.
Desde a sua criação foi possível aos agentes da LAPD participar em centenas de eventos, envolvendo todos os intervenientes, nomeadamente no “Fórum Muçulmano anual”, que reúne os líderes comunitários com o topo da hierarquia da LAPD, bem como na participação em todo o tipo de eventos, como workshops, palestras, seminários inter-religiosos, sessões de esclarecimento/informação, celebrações comunitárias e festivais, além de inúmeras contactos pessoais, tendo ainda sido implementado um programa de intervenção, que identifica e apoia indivíduos em risco de radicalização violenta.
Outra boa prática referida no relatório foi a que a Royal Canadian Mounted Police implementou e que consiste na realização regular de exercícios de simulação, nos quais os membros das comunidades que foram afetadas por investigações de terrorismo trocam de lado e desempenham o papel de investigadores.
As simulações são realizadas após um pequeno briefing, sendo os participantes divididos em pequenas equipas e colocados perante cenários que exigem a tomada decisões difíceis, sendo cada decisão discutida e documentada dentro do tempo previamente definido, levando a que os participantes conheçam a complexidade das investigações de terrorismo, com o objetivo de impedir um ataque terrorista, tendo em conta as expectativas dos cidadãos, da pressão política e em cumprimento da lei, sendo a avaliação realizada, bastante positiva, porque no final das simulações, os participantes “conseguiram por termo a um plano de atentado terrorista, mas mais importante, saíram todos com uma melhor compreensão das realidades de uma investigação de terrorismo”.
Correndo o risco de ser redundante, e apesar do Policiamento de Proximidade/Comunitário ser uma realidade no nosso país há pelo menos 25 anos, parece-me que tanto os militares da GNR como os agentes da PSP necessitarão de formação específica em prevenção do VERLT, especialmente aqueles que se encontram afetos aos programas especiais, em particular ao Programa Escola segura, se não a possuírem já.