Opinião (Rogério Copeto): UMA ESTRATÉGIA E O CRIME DE ABANDONO DE IDOSOS.


O Conselho de Ministros aprovou na última 5ª-feira, dia 13 de agosto, “A Estratégia de Proteção ao Idoso”, que tem como objectivo reforçar o reconhecimento dos direitos da pessoa idosa.

Roger Copeto_800x800Rogério Copeto

Tenente-Coronel da GNR, Mestre em Direito e Segurança e Auditor de Segurança Interna

Chefe da Divisão de Ensino/ Comando da Doutrina e Formação

Esta estratégia prevê algumas medidas, entre as quais a criminalização de alguns comportamentos violadores dos direitos dos idosos e a definição de um estatuto da pessoa idosa, onde serão expressos de forma clara os seus direitos, à semelhança do que já existe para a vítimas de violência doméstica.

Conforme referido “A Estratégia de Proteção ao Idoso” prevê que algumas condutas que atentam contra os direitos fundamentais dos idosos possam vir a ser consideradas como crime, numa futura alteração ao Código Penal.

A última alteração ao Código Penal aconteceu no último dia 5 de agosto, com a aprovação da Lei n.º 83/2015 de 5 de agosto, que altera o Código Penal pela 38º vez e que entrará em vigor no próximo dia 5 de setembro, conforme referido no nosso último artigo, que escrevemos por motivo da criminalização dos crimes de “Perseguição” e de “Casamento forçado” e da autonomização do crime de “Mutilação genital feminina”.

Assim, à semelhança dos referidos crimes, que a partir do dia 5 de setembro começarão a ser punidos, também o crime, de “Abandono de idosos”, de “Recusa de acolhimento em instituições públicas”, de “Recusa de acesso à aquisição de bens devido à idade” e a de “Realização de negócios jurídicos sem consentimento”, também poderiam começar desde já a ser punidos.

Para que tal acontecesse bastaria que esses crimes tivessem sido incluídos nesta última alteração do Código Penal, evitando-se que a criminalização destas condutas corram o risco de nunca virem a ser consideradas como crime, porque para que isso aconteça é necessário a aprovação de uma Lei da Assembleia da República, fato que não acontecerá nesta legislatura.

Não há dúvida que estas condutas não moralmente censuráveis e que ninguém as devia praticar, mas sabemos que a realidade não é essa, e com frequências temos noticias de abandono de idosos nos hospitais, por quem os tem à sua responsabilidade, verificando-se que as soluções para esses casos são a institucionalização do idoso, quando poderia regressar à sua casa.

É por isso essencial a tipificação desses comportamentos como crime, porque visa a sua prevenção e funciona como dissuasor da prática dessas condutas, constituindo-se como uma medida acertada e que merece o nosso aplauso.

Mas, conforme já referido, as condutas que “A Estratégia de Proteção ao Idoso” pretende que sejam consideradas como crime ainda não o são. Poderiam estar já incluídas no Código Penal, mas não estão, desconhecendo-se o motivo pelo qual não se aproveitou esta última alteração ao Código Penal.

Por esse motivo estas condutas continuarão a ser praticadas, sem que delas resulte alguma punição para os seus autores.

Para melhor se perceber o que está em causa, a seguir indicamos quais os eventuais crimes que se pretendem vir a ser incluídos no Código Penal:

– Crime de “Abandono de idosos”: Comete o crime quem, sendo descendente ou ascendente ou tenha a cargo idoso à sua responsabilidade, o abandonar em hospital ou em outro estabelecimento de prestação de cuidados de saúde;

– Crime de “Recusa de acolhimento”: Comete o crime quem recusar a idoso o acesso ou a sua permanência em estabelecimento público para idoso, quando estes recusarem assinar uma procuração para fins de administração ou disposição dos seus bens ou em efetuar disposição patrimonial a favor da instituição;

– Crime de “Recusa de acesso a bens jurídico”: Comete o crime quem recusar a idoso ou dificultar o acesso à aquisição de bens ou à prestação de serviços devido à idade

– Crime de “Realização de negócio jurídico sem consentimento”: Comete o crime quem realizar negócio jurídico em nome de idoso, sem o seu pleno conhecimento.

Em princípio serão estes os crimes que poderão vir a ser incluídos na nossa Legislação Penal, numa futura alteração ao Código Penal, que não se sabe quando irá acontecer.

Em artigos anteriores já abordamos o fenómeno da criminalidade praticada contra idosos, sendo que em 2011 cerca 6,5% da população idosa foi vítima de crime, representando a população idosa cerca de 19% da população residente, verifica-se assim a existência de uma baixa incidência criminal sobre esta população no ano de 2011, facto que se tem verificado no últimos anos, levantando-se a questão de que os idosos não denunciam os crimes de que são vítimas.

Mesmo concordando com a criminalização das condutas atrás referidas, consideramos que o trabalho deve ser direccionado para a prevenção, especialmente na sensibilização e informação junto da população idosa, para que denunciem todos os crimes de que são vítimas, sabendo que os autores são quase sempre membros da sua família ou que estão muito próximos, ou seja maioritariamente os idosos são vítimas daqueles que tem a responsabilidade deles cuidar e dai advém a principal dificuldade do idoso em formalizar a denúncia.

Consideramos ainda que qualquer estratégia de protecção aos idosos deve envolver todas as instituições que trabalham nessa área, porque são essas instituições de primeira linha, que conhecem a realidade da população idosa e que podem encontrar na rede uma solução para esses problemas.

A GNR como instituição de primeira linha, desenvolve diversas actividades de apoio aos idosos, sendo exemplo desse trabalho a “Operação Censos Sénior” que é já no panorama nacional, reconhecidamente por toda a sociedade civil, uma referência nacional na proteção e no combate ao isolamento dos idosos.

Por isso não é de estranhar que a “Operação Censos Sénior” foi considerada como boa prática no estudo elaborado pelo “Centro de Estudos dos Povos e Culturas de Expressão Portuguesa”, da Faculdade de Ciências Humanas, da Universidade Católica Portuguesa sobre “O Envelhecimento da População: Dependência, Ativação e Qualidade” onde é referido que “… a Operação Censos Sénior… apresenta-se como uma das intervenções de grande contributo no conhecimento prático sobre esta temática em Portugal, ao cooperar para a caracterização desta população a nível nacional e na sinalização de situações de vulnerabilidade que carecem de acompanhamento social… Em Portugal, considera-se como uma boa prática o trabalho desenvolvido pela GNR, enquanto projeto que funciona como plataforma que identifica situações de pessoas idosas isoladas em situação de risco e vulnerabilidade e as encaminha para os serviços de apoio adequados a situação”.

Verifica-se assim, que a GNR assume um papel preponderante em defesa de um estrato da polução portuguesa extremamente vulnerável, que são os idosos, devendo obrigatoriamente participar numa eventual estratégia de apoio aos idosos, juntamente como todas as outras instituições de que é parceira, devendo ainda o trabalho em rede ser o principal objectivo de qualquer “Estratégia de Proteção ao Idoso”.


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