Quarta-feira, Novembro 26, 2025

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“Operação Safra Justa”:  PJ deteve dez militares e um PSP suspeitos de coagir imigrantes escravizados na agricultura.

Era uma espécie de braço armado de uma rede de exploração laboral de imigrantes no Alentejo. Coagiam ou agrediam os trabalhadores agrícolas estrangeiros em situação de vulnerabilidade, forçados a trabalhar por salários reduzidos e sem contrato formal.

Foi por estas suspeitas que, ontem, a Polícia Judiciária deteve dez militares da GNR e um elemento da PSP, além de empresários agrícolas e intermediários. O serviço de “vigilância e coação privada”, praticado pelos elementos das forças de segurança, seria liderado por um oficial da GNR, com o posto de tenente.

Em causa estão crimes de auxílio à imigração ilegal, de tráfico de pessoas, de corrupção ativa e passiva, e de abuso de poder.

De acordo com informações recolhidas pelo JN/LN, os dez militares e o agente da PSP, de baixa há vários meses, são suspeitos de prestar auxílio aos gestores de uma empresa de trabalho temporário que explorava os imigrantes em situação de fragilidade. O serviço incluiria a vigilância das vítimas nas herdades alentejanas, por vezes executado pelos suspeitos fardados e com carros de patrulha. Seria o tenente, Rui Silva, enquanto comandante do Destacamento de Intervenção, quem dava cobertura interna ao esquema de “segurança privada”. Aparentemente, era secundado por um sargento, atualmente a prestar serviço no Grande Porto, onde foi detido.

Corrupção

Os elementos das forças de segurança receberiam dinheiro para, “fora das respetivas competências profissionais e infringindo os deveres a que estão obrigados em razão do exercício de funções públicas”, exercer “o controlo e vigilância dos trabalhadores estrangeiros”, adiantou o Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP), que tutela a investigação.

Os militares e o agente da PSP serviam ainda como “escudo”, ao dar a entender aos imigrantes explorados que eventuais queixas às autoridades não iriam ter consequências. Não seriam “uma alternativa viável para reagir aos abusos de que foram e/ou estão a ser alvo”, precisou o DCIAP.

Empresa visada

O esquema passou pela criação de uma empresa de trabalho temporário que se aproveitava da vulnerabilidade dos imigrantes, “explorando-os, cobrando alojamentos e alimentação e mantendo-os sob coação através de ameaças, havendo mesmo vários episódios de ofensas à integridade física”, adiantou ontem de manhã a PJ, que realizou as buscas e detenções (ver texto ao lado) no âmbito da operação batizada Safra Justa.

As vítimas concordavam em trabalhar sem contrato formalizado e recebiam assim um salário “inferior ao praticado no mercado para as funções que aceitaram realizar, em setores de utilização intensiva de mão de obra, como a agricultura”, revelou ainda o DCIAP.

Os líderes da rede reduziam das remunerações valores considerados excessivos para as despesas de alojamento, transporte, água, eletricidade e documentação. Os impostos devidos ao Estado também não seriam entregues na totalidade.

A investigação, iniciada em 2023, rodeou-se de todos os cuidados para se manter em segredo, mas “permitiu obter indícios e elementos incriminatórios, bem como traçar o quadro geral do funcionamento deste grupo violento, de estilo mafioso”, explicou a PJ, que contou com a colaboração e suporte da GNR.

Mercearias, cafés, antigo lar, tudo servia como habitação

Inspetores surpreenderam arguidos de madrugada e fizeram buscas em locais usados como dormitórios para vítimas.

Cerca de uma centena de inspetores da Unidade Nacional de Contraterrorismo da Polícia Judiciária, com reforços da Diretoria de Faro e da Unidade Local de Investigação Criminal de Évora, deram, ontem de madrugada, cumprimento a 48 mandados de busca a residências dos detidos, espaços comerciais, nomeadamente em mercearias, uma empresa de contratação de trabalhadores temporários, uma cabeleireira, um espaço num Parque Industrial.

As buscas começaram pelas 04h30 e ocorreram, essencialmente, na cidade de Beja e na freguesia de Cabeça Gorda. Também houve diligências em Baleizão, Beringel, Santa Clara de Louredo e Penedo Gordo. Além de Serpa, houve ainda buscas em Castro Verde e Gondomar, em habitações pertencentes a um sargento da GNR, que, antes de ser transferido para o norte, foi comandante de posto no Alentejo.

Vinte e seis das buscas tiveram como objetivo vasculhar os espaços utilizados pela rede criminosa para albergar os trabalhadores estrangeiros explorados, sujeitando os mesmos as condições deploráveis, dormindo no chão em colchões, em casas sobrelotadas onde pernoitavam mais de uma dezena de pessoas. Na localidade de Cabeça Gorda, além de um café, um antigo lar servia de habitação dos explorados.

As vítimas viveriam também num quadro de má nutrição sendo explorados na cobrança de alimentos e alojamentos, mantidos sob coação de ameaças.

Notícia: Jornal de Notícias/ Lidador Notícias (Teixeira Correia)

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