Opinião (Rogério Copeto/Oficial da GNR): SAFETY E SECURITY.


A palavra portuguesa “segurança” tem tradução na língua inglesa, em duas palavras distintas, que também têm significados diferentes: safety e security.

Rogério Copeto

Tenente-Coronel da GNR

Mestre em Direito e Segurança e Auditor de Segurança Interna

Chefe da Divisão de Ensino/ Comando de Doutrina e Formação

Na língua inglesa a palavra security está relacionada com a prevenção da criminalidade, nomeadamente na prevenção dos crimes contra o património, contra as pessoas, contra a vida em sociedade, etc, e a palavra safety está relacionada com a segurança no trabalho e na saúde, na proteção e socorro, e na prevenção de riscos associados à falta de condições segurança, quase sempre estruturais.

E trazemos ao LN este assunto tendo em conta as recentes notícias, que dão conta que os portugueses se sentem seguros, conforme deu conta o Público na sua edição de ontem, no artigo com o título “Portugueses sentem-se mais seguros, diz barómetro da APAV”, onde é referido que “com dados comparativos entre 2012 e 2017, inquérito a 600 pessoas de todo o país feito por Associação Portuguesa de Apoio à Vítima indica que só 10% sente insegurança. Clima de ‘paz social’ ajuda a explicar parte de resultados”.

Mas no entanto a ocorrência de acidentes como o incêndio de Tondela, do dia 13 de janeiro, onde faleceram 9 pessoas, conforme o artigo do Observador deu conta ontem, no seu artigo denominado “Incêndio em Tondela. Número de mortos sobe para nove”, verificamos que os portugueses têm razões para não se sentirem seguros.

Ou seja, os portugueses por um lado sentem-se seguros, não sendo isso notícia, porque Portugal é o terceiro país mais seguro do mundo, conforme deu conta o Jornal de Notícias no seu artigo de 1 de junho do ano passado, com o título “Portugal é o terceiro país mais pacífico do mundo”, e por outro, não têm motivos para se sentirem seguros, uma vez que as ocorrências, das quais resultam vítimas mortais, registam uma frequência que consideramos elevadas, seja em consequência de incêndios urbanos ou florestais (tendo 2017 sido o pior ano de sempre), seja em consequência de acidentes de trabalho (115 mortos e 315 feridos graves no ano passado) ou em consequência de acidentes rodoviários (o pior dos últimos anos no que diz respeito ao número de vítima mortais), sem esquecer as mortes em resultado da queda de aeronaves na praia ou de arvores em santuários religiosos ou dos afogamentos em praias, lagos, albufeiras, rios e riachos, só para referir alguns dos acidentes, onde Portugal regista um número bastante elevado de vítimas, nomeadamente no último ano.

Se na língua portuguesa para abordarmos o conceito de “segurança”, nas duas vertentes atrás referidas, usamos a mesma palavra, na língua inglesa, teríamos de usar os dois termos já referidos, nomeadamente para a primeira situação a palavra security, quando no referimos que os portugueses se sentem seguros e a palavra safety, quando verificamos que não têm razões para se sentir em segurança.

Porque no que diz respeito à proteção contra atos criminosos e intencionais de terceiros, cuja responsabilidade é das Forças de Segurança, GNR e PSP, o referido artigo do Público dá conta que “o sentimento de insegurança em Portugal diminuiu nos últimos cinco anos … Só 10% dos inquiridos considera a zona onde reside como perigosa ou insegura, quando em 2012 essa percentagem era de 19%, mostra o resultado de um questionário com 600 entrevistas telefónicas distribuídas por Portugal continental à população com 15 e mais anos. Dessa amostra, 53% é do sexo feminino e 47% do sexo masculino … Também diminuiu o número de pessoas que têm medo de assalto à sua residência, por um lado, ou que o seu veículo seja alvo de furto ou dano … Quanto a assalto, agressão ou outro apenas 3% disse ter sido vítima de algum desses crimes, quando em 2012 era 5% da amostra”.

Sendo que este sentimento de segurança sentido pelos portugueses não é beliscado pela existência de um “desfasamento entre a distribuição das forças de segurança e a da população pelo país”, conforme deu conta o artigo do Diário de Notícias de ontem, com o título “Metade da população só tem polícia a mais de 5 km”, que divulga as conclusões de um estudo de uma equipa de peritos em informação geográfica e segurança da Universidade Nova.

Por outro lado a falta de segurança que se faz sentir, quando no referimos à palavra inglesa safety, refere-se à falta de prevenção de actos não intencionais provenientes da inexistência de segurança de equipamentos de trabalho, infra-estruturas ou mesmo descuido humano, podendo este conceito ser exemplificado com recurso ao artigo do Observador de 14 de janeiro, com o título “Tondela. Perguntas e respostas para perceber o que correu mal”, onde podemos verificar que o incêndio ocorreu por violação das mais básicas regras de segurança (safety), nomeadamente: O aparelho de aquecimento (salamandra) tinha um tubo que o ligava ao telhado do edifício, passando por um teto falso, que continha placas de gesso cartonado, com material de isolamento e fibra de vidro, e que rapidamente se incendiou (uso de materiais inflamáveis e que emanam gases tóxicos, caso se incendeiem); A abertura de uma janela que permitiu a entrada de oxigénio e que alimentou a combustão, aumentando o fumo; O não uso de extintores ou outros meios de extinção de chamas, como a água; Elevado número de pessoas no local (60 a 70 pessoas), e; Uma única saída para o exterior do edifício, cuja porta abria para o interior, onde se acumularam a maioria das vítimas, que após autópsia, se verificou que nenhuma morreu em consequência de queimaduras.

Esta ocorrência é um excelente exemplo da falta de segurança (safety), que existia na Associação Cultural, Recreativa e Humanitária de Vila Nova da Rainha, em Tondela, sendo que todos os habitantes daquela localidade se sentem seguros (security), á semelhança da restante população portuguesa.

Assim, tomando como exemplo os habitantes da povoação de Vila Nova da Rainha, conclui-se que o nível de risco existente na Associação Cultural, Recreativa e Humanitária de Vila Nova da Rainha era elevado, ao nível da safety, uma vez que não foram implementadas medidas safety  de modo a reduzir o risco de incidentes/acidentes, nomeadamente o risco de incêndio. Mas no que diz respeito à sua security, todos os seus habitantes, se sentiam seguros, porque a probabilidade de ocorrência de crimes contra o património ou contra as pessoas é diminuto.

Pelo exposto consideramos que a segurança das populações nas duas vertentes safety e security devem ser preocupação de todos os responsáveis, podendo-se concluir no entanto, que no que respeita à security estamos no bom caminho, havendo ainda muito por fazer no que diz respeito à safety.


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