Opinião (Rogério Copeto): O CIBERBULLYING E A INDIGNAÇÃO NAS REDES SOCIAIS
Duas imagens divulgadas nas redes sociais, na semana passada, colocaram o país a falar novamente nos fenómenos do bullying e do ciberbullying. Primeiro foi a imagem que ridicularizava um concorrente a um programa de televisão e depois um vídeo de agressões entre adolescentes.
Tenente-Coronel da GNR, Mestre em Direito e Segurança e Auditor de Segurança Interna
Chefe da Divisão de Ensino/ Comando da Doutrina e Formação
A última grande discussão sobre os fenómenos do bullying e do ciberbullying tinha ocorrido em 2011, quando foi divulgado um vídeo de duas adolescentes a espancar uma terceira, tendo na altura chocado a generalidade das pessoas e o assunto ter sido abordado até à exaustão.
Por coincidência também nessa altura tinha sido apresentada uma proposta na Assembleia da República, que acabou por caducar, para inclusão no Código Penal do crime de bullying, como crime público, uma vez que o fenómeno não está tipificado na legislação penal, sendo considerado como bulllying, as ofensas à integridade física, as injurias e as ameaças, crimes que para serem investigados necessitam que seja apresentada queixa.
Na semana passada mais uma vez o assunto foi trazido à discussão, primeiro com a ridicularização do candidato número 5295 do concurso Ídolos da SIC, que cantou um tema da cantora Rihanna, tendo aquando da difusão da sua prestação, aparecido caracterizado com duas enormes orelhas.
A imagem do concorrente nº 5295, com umas orelhas excepcionalmente grandes, assim que foi difundida nas redes sociais tornou-se imediatamente viral e gerou uma enorme revolta em todos os cibernautas, por ridicularizar de forma gratuita aquele concorrente.
A SIC lamentou o sucedido “…pois não foi sua intenção ferir susceptibilidades…”, mas o candidato nº 5295, de nome Alexandre e com 16 anos de idade, diz-se vítima de bullying, não aceitou as desculpas e garante que vai processar a SIC, porque por vergonha deixou de ir à escola, não sabe quando voltará a ter coragem para voltar e exige ser indemnizado por isso.
Para o Alexandre não foi o fato da sua prestação não ter corrido como pretendia, tendo o júri lhe dito que desafinou um bocado, quando cantou o tema “Diammonds” da Rihanna, apesar de sabermos que os júris deste tipo de programas, podem ser bastante mauzinhos e até existem alguns, cuja imagem de marca é ser bully. O que fez o Alexandre não querer sair de casa foi a divulgação das imagens nas redes sociais, ou seja o cibberbullying.
O segundo episódio que fez correr muita tinta nas redes sociais e nos OCS, foi a divulgação de um vídeo onde duas adolescentes agridem um terceiro adolescente, enquanto são incentivadas por outros.
O vídeo assim que foi divulgado na semana passada tornou-se viral com milhares de partilhas e milhões de visualizações, tendo provocado uma enorme onda de choque em toda a população, e sido chamados todos os especialistas para comentar o assunto, assim como os intervenientes diretos e indirectos da ocorrência.
Este adolescente que foi vítima de bullying, num local público e de passagem de pessoas, no ano passado, que pelas razões conhecidas, quase sempre associadas ao medo, não denunciou a situação, viu novamente a ferida a ser aberta, com a divulgação das imagens, contribuindo para a continuação das agressões, agora na forma de ciberbullying.
Ambas as situações caracterizam na perfeição o fenómeno do ciberbullying, sendo que nas duas, os agressores foram todos aqueles que visualizaram e partilharam as imagens e os vídeos, sendo esse o principal objectivo dos ciberbullys, humilhar as suas vítimas com a divulgação de imagens de agressões ou a ridiculariza-las.
E essa mesma indignação a que se assistiu nas redes sociais nos últimos dias, infelizmente não se vê na realidade do dia-dia. Basta andar hoje por qualquer local público, seja um centro comercial, ou transporte público, nas ruas e avenidas das nossas cidades, de noite e de dia, para assistirmos a incivilidades, vandalismos ou actos criminosos e as mesmas pessoas que se indignam nas redes sociais, viram a cara ou passam ao lado, como se não fosse nada com elas.
Por isso, se a indignação que ocorre nas redes sociais, com denúncias de tudo e mais alguma coisa, fosse semelhante àquela que não se faz na realidade, existiriam muito menos cifras negras (crimes não comunicados) e muito menos sentimento de impunidade por parte de quem comete crimes e vê o seu acto passar impune por ausência de denúncia das sua vítimas e testemunhas.
A indignação e a denúncia de crimes que se faz nas redes sociais, deverá antes ser dirigida para as forças de segurança e para o ministério público, para que possam ser investigadas. Não é o maior ou menor número de vezes que se partilha uma notícia de crime nas redes sociais que levará à sua investigação, nem a partilha de imagens de agressões ou a ridicularizar pessoas é a melhor forma de prevenir ou denunciar o fenómeno do bullying ou do ciberbullying.
Também para reflexão fica o outro assunto que esteve na ordem do dia, na semana passada, e que foi o homicídio de um adolescente de 14 anos por um jovem adulto de 18 anos, autor confesso do crime e que esteve desde os seus 8 anos em estabelecimentos correccionais e prisionais, podendo-se concluir que esse mesmo sistema não conseguiu evitar que uma criança em perigo se transformasse num adulto perigoso.
Entretanto e para finalizar, aguardo com expectativa, a resposta do Ministério da Edução e Ciência às questões que os deputados do Grupo Parlamentar do PS fizeram sobre o “desfasamento de 4907 ocorrências entre o relatório elaborado pela tutela do Ministério da Educação e o relatório elaborado pelas forças de segurança PSP e GNR”.