Beja: Irmãos moldavos intermediários de trabalho escravo.


Acusados pelo Ministério Público de dezenas de crimes de tráfico de pessoas e imigração ilegal no Baixo Alentejo.

Foi na sequência de uma busca domiciliária levada a cabo no número 8 da Rua Aresta Branco, localizada no centro histórico de Beja, que os inspetores do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) perceberam a teia montada pelos irmãos Dicov, para explorar e escravizar compatriotas em herdades do Baixo Alentejo.

Na casa encontraram 540 euros, 10800 cigarros de fabrico artesanal, documentação sobre as empresas Tatiana Ivanova e Matei Costel, suportadas por “testas de ferro”, listagens de trabalhadores, “contratos de trabalho”, bilhetes de identidade romenos falsos. A Segurança Social deu conta aos investigadores que centenas de trabalhadores foram ligados àquelas empresas, mas que estavam a trabalhar em situação irregular para os arguidos Sergiu e Victor Divoc.

No despacho de acusação da Procuradora do Ministério Público (MP) do Departamento de Investigação e Ação Penal (DIAP) de Évora, a que o Lidador notícias (LN) teve acesso, Sergiu Dicov, de 42 anos, Vitor Dicov, de 35 anos, e as duas empresas estão acusados da prática de crimes de tráfico de pessoas, associação de auxílio à imigração ilegal e falsificação de documentos. O MP além de pedir a condenação dos arguidos pediu a aplicação da pena acessória de expulsão do território nacional.

Nascidos na Moldávia, Sergiu, Victor e Ion, “apoiados” pelas duas empresas unipessoais, “criadas” por Tatiana e Matei, aliciavam e traziam para Portugal dezenas de cidadãos daquele país, que depois controlavam, ficando-lhes com os passaportes, sujeitando-os a um trabalho escravo, alojados em habitações precárias e sobrelotadas. Houve alturas em que os trabalhadores eram agredidos e expulsos das casas onde pernoitavam, caso reclamassem das condições laborais. Durante a investigação os inspetores do SEF concluíram que Ion, o mais novo dos irmãos, era tão-somente o “homem de campo” que controlava os horários de laboração dos trabalhadores.

Segundo o MP, o esquema dos Dicov era de tal forma opressivo que obrigaram a que Tatiana Ivanova e Matei Costel criassem as duas empresas, mas que eram controladas por Sergiu, para colocar os trabalhadores em diversas herdades do Baixo Alentejo, nomeadamente nos concelhos de Beja (Rabadoa) e Ferreira do Alentejo (Fonte Boa), depois de contratarem a prestação de trabalho junto dos seus proprietários.

Além de não fazerem contratos de trabalhos, os trabalhadores também não tinham direito ao pagamento de horas extraordinárias, subsídio de férias e de Natal. O despacho do MP revela que a cada vítima “descontavam 135 euros pela viagem da Moldávia para Portugal, 65 euros pela renda da casa e despesas de água, luz e gás e quantias entre os 150 e os 400 euros por despesas com a obtenção do número de contribuinte português”.

Baleizão, Beringel, Neves, Mombeja tudo localidades e sedes de freguesia do concelho de Beja, eram os sítios onde os Dicov alojavam os trabalhadores amontoados em habitações com 40/50 pessoas no seu interior.

Após a detenção em julho de 2019, os dois moldavos foram sujeitos a termos de identidade e residência apresentações semanais às autoridades, proibição de contatarem com as vítimas e ausentarem-se para o estrangeiro. Os irmãos Dicov fizeram “tábua rasa” das decisões judiciais e em dezembro daquele ano deixaram Portugal, não sem que dois meses antes tivessem sido visualizados na cidade de Beja, a recolher passageiros vindos de autocarro desde a cidade de Chisinau.

O julgamento, cuja data não está ainda agendada, vai realizar-se no Juízo Criminal de Beja, perante um Tribunal Coletivo, estando arroladas, 37 testemunhas, na sua maioria as vítimas laborais dos irmãos Dicov.

Os crimes de que estão acusados

Sergiu Divoc: 5 crimes de tráfico de pessoas, 1 crime de associação de auxílio à imigração ilegal, 25 crimes de auxílio à imigração ilegal e 7 crimes de falsificação de documentos.

Victor Divoc: 5 crimes de tráfico de pessoas, 1 crime de associação de auxílio à imigração ilegal e 25 crimes de auxílio à imigração ilegal.

Tatiana Ivanova, Unipessoal, Lda: 5 crimes de tráfico de pessoas, 1 crime de associação de auxílio à imigração ilegal e 26 crimes de auxílio à imigração ilegal.

Matei Costel, Unipessoal, Lda: 1 crime de associação de auxílio à imigração ilegal e 9 crimes de auxílio à imigração ilegal.

Julgamento em Beja a 20 de setembro

 O casal Usurelu, de nacionalidade romena, foi acusado pelo Departamento de Investigação e Ação Penal (DIAP) de Évora de 13 crimes de tráfico de pessoas e 9 crimes de auxílio á emigração ilegal. A Angy San, Lda, empresa controlada pelos arguidos, está também acusada dos mesmos crimes.

Última condenação dezembro de 2020

Em dezembro de 2020 seis indivíduos, com idades compreendidas entre os 27 e os 49 anos, de nacionalidade romena e moldava foram condenados a penas de prisão, ainda que algumas foram suspensas na sua execução, por um crime de auxílio à imigração ilegal, em coautoria material.

Teixeira Correia

(jornalista)


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