Opinião (Rogério Copeto): O TRÁFICO DE SERES HUMANOS
O Tráfico de Seres Humanos (TSH), nas suas várias vertentes, não é um fenómeno recente e tampouco se confina hoje às fronteiras de alguns países e/ou regiões de mundo dito mais pobres, constituindo uma grave violação dos direitos humanos, na medida em que afeta sobretudo grupos vulneráveis como as mulheres e as crianças em qualquer ponto do mundo, não estando o nosso pais imune às redes de TSH.
Tenente-Coronel da GNR, Mestre em Direito e Segurança e Auditor de Segurança Interna
Chefe da Divisão de Ensino/ Comando da Doutrina e Formação
É sabido que o TSH assume diversas modalidades, podendo ser encarado na perspetiva da obtenção de trabalho forçado, do transplante e venda ilegal de órgãos, da adoção ilegal de crianças e da exploração sexual de mulheres e crianças.
Se na exploração laboral qualquer pessoa pode ser vítima de trabalhos forçados na agricultura, na construção civil ou em fábricas, na exploração sexual as vítimas são na sua grande maioria mulheres e crianças, que têm como destino a prostituição.
No âmbito do cumprimento da sua missão a GNR, tem por missão assegurar a defesa dos direitos e liberdades dos cidadãos, garantindo a legalidade e os mais elevados padrões de segurança e de tranquilidade públicas, nas respetivas áreas e nas matérias da sua responsabilidade.
Para levar a cabo as suas atribuições, a GNR dispõe de diversas Unidades e Órgãos, de que destacamos as Unidades Territoriais, localizadas em todos os Distritos do Continente e Ilhas que executam todas as funções policiais, legalmente atribuídas, nas áreas à sua responsabilidade.
As Unidades Territoriais da GNR, por intermédio dos seus Postos Territoriais, das Secções de Programas Especiais e dos Núcleos de Investigação Criminal, têm o encargo de proceder à sinalização, identificação e acompanhamento das situações criminais, incluindo no âmbito do TSH, promovendo quando necessário, o atendimento especializado e personalizado e as adequadas e possíveis ações de proteção às vítimas.
O sistema de patrulhamento orientado para o problema permite que determinadas situações sejam alvo de uma abordagem policial específica, por militares conscientes e alertados para as problemáticas, capazes de identificar as situações, sinalizando-as junto das entidades competentes, para que seja possível um acompanhamento preventivo e antecipado.
Nos casos específicos da temática do TSH, esta ação traduz-se numa orientação de ações de policiamento e operações, frequentemente conjuntas com outras Forças e Serviços de Segurança, para locais onde são passíveis de ocorrer casos de tráfico para fins de exploração sexual (bares, casas de alterne e outros estabelecimentos de diversão noturna) e de exploração laboral (atividades de construção civil e obras públicas, atividades sazonais e serviços domésticos).
As situações detetadas são encaminhadas para o respetivo tribunal, que determina as ações investigatórias a levar a cabo, pelos órgãos de polícia criminal competentes (o Crime de Tráfico de Pessoas previsto e punido pelo art.º 159.º CP é um crime cuja investigação é da competência reservada da Polícia Judiciária e do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras).
A atuação da GNR efetua-se sempre tendo em consideração uma visão integrada da problemática criminal, que contempla também as vertentes de prevenção e de apoio às vítimas, onde se incluem a aplicação de medidas adequadas à sua proteção.
Neste particular haverá a referir os Núcleos de Investigação e de Apoio a Vítimas Específicas, cujos militares recebem formação específica e especializada de investigação criminal e apoio à vítima. Esta valência, especialmente vocacionada para a prevenção, acompanhamento e investigação (quando a investigação do crime é da competência da GNR) de situações de violências exercidas sobre vítimas com necessidades específicas, onde se incluem as vítimas de tráfico, vem permitindo à GNR melhorar a sua resposta operacional no âmbito das violências cometidas contra os grupos de pessoas tendencialmente mais vulneráveis e que constituem um fenómeno social emergente de elevada complexidade. Cabe ainda à GNR efetuar o encaminhamento de vítimas para os organismos da rede de apoio à vítima mais indicados para cada situação em concreto, no âmbito das parcerias existentes.
A GNR na sua ação específica no âmbito do TSH colabora com diversos Organismos e Instituições ligadas a esta problemática, nomeadamente com as outras Forças e Serviços de Segurança através dos mecanismos de coordenação estabelecidos e com entidades e Organizações Governamentais e Não-governamentais.
No âmbito da formação a GNR colabora na implementação do II Plano Nacional Contra Tráfico de Seres Humanos, onde no âmbito da execução das suas medidas, já foi ministrada formação aos militares da Guarda sobre a temática.
Também no âmbito da parceira com o projeto SOS TSH tem sido ministrada formação aos militares da GNR, que neste projeto tem como tarefas prestar assistência às vítimas e encaminhá-las para a Associação para o Planeamento da Família, entidade gestora do projeto, como aconteceu recentemente na zona de Beja, onde vários cidadãos romenos estavam a ser explorados por seus concidadãos.
No TSH como noutros crimes a denúncia é obrigatória para todos os que tiverem conhecimento de situações em que cidadãos nacionais ou estrangeiros sejam aliciados para ofertas de empregos de sonho, promessas de salários altos, mesmo que provenham de pessoas conhecidas das vítimas. Também como sinais de alerta está o controlo de movimentos e privação de liberdade, mesmo que não explícita, a obrigação de entregar os documentos de identificação, as ameaças diretas ou indiretas e de forma mais grave, as ofensas corporais e sexuais, existindo quase sempre dívidas pecuniárias para com os supostos empregadores, que terão de ser pagas pelas vítimas.
Em Portugal, o crime de tráfico de seres humanos é punível com pena de prisão até 12 anos, agravado quando as vítimas sejam menores de idade, sendo o crime praticado por quem oferecer, entregar, recrutar, aliciar, aceitar, transportar, alojar ou acolher pessoa para fins de exploração, incluindo a exploração sexual, a exploração do trabalho, a mendicidade, a escravidão, a extração de órgãos ou a exploração de outras atividades criminosas, exercendo violência, rapto, abuso de autoridade ou aproveitando-se de uma incapacidade psíquica da vitima.