“NO CHÃO NÃO, NO VELHÃO”


O tema da proteção dos idosos é frequentemente abordado por mim aqui no Lidador Noticiais, tendo o último o artigo sido publicado no dia 15 de junho, com o titulo “Obrigatório denunciar a violência contra os idosos”, trazendo hoje novamente o assunto, para relembrar que fez agora oito anos que foi aprovada a “Estratégia de Proteção ao Idoso”, sem no entanto ter sido ainda criminalizado o crime de abandono, tendo por isso o titulo do artigo sido roubado de um sketch dos Gato Fedorento, com o mesmo nome.

Rogério Copeto

Coronel da GNR

Mestre em Direito e Segurança e Auditor de Segurança Interna

A “Estratégia de Proteção ao Idoso”, foi aprovada pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 63/2015, de 25 de agosto de 2015 e tinha como objetivo reforçar o reconhecimento dos direitos da pessoa idosa, nas áreas, da não discriminação, nomeadamente em razão da idade, na promoção da autonomia e participação, na proteção contra a violência e os abusos, na proteção social e emprego, na promoção da saúde e no acesso à justiça.

E na sequência da RCM n.º 63/2015 foi apresentada na Assembleia da República o Projeto de Lei 62/XIII/1, onde se proponha a “41ª Alteração ao Código Penal (CP), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 400/82, de 23 de setembro, criminalizando um conjunto de condutas que atentam contra os direitos fundamentais dos idosos”, tendo esta Iniciativa Legislativa caducado em 24 de outubro de 2019. Tendo a última alteração ao CP ocorrido no mês passado de julho, tendo a Lei n.º 35/2023, de 21 de julho, alterado o CP pela 58.º vez.

A “Estratégia de Proteção ao Idoso” prevê a definição de um estatuto da pessoa idosa, expressando de forma clara os direito dos idosos, à semelhança do que já existe para a vítimas de violência doméstica, e para além de outras medidas, previa a criminalização de alguns comportamentos violadores dos direitos dos idosos, que nunca viram a luz do dia, porque a Iniciativa Legislativa para alterar o CP caducou em 2019, conforme já referido.

Os crimes que seriam incluídos no CP visavam punir condutas, que ainda hoje são moralmente censuráveis e que ninguém as devia praticar, mas sabemos que a realidade não é essa, e com frequências temos noticias de abandono de idosos nos hospitais, por quem os tem à sua responsabilidade, verificando-se que as soluções para esses casos são a institucionalização do idoso, quando poderia regressar à sua casa, sendo por isso importante e urgente a tipificação destes comportamentos como crime, porque visam a sua prevenção e funcionam como dissuasor da prática dessas condutas.

Seriam cinco as condutas que se pretendia ver criminalizadas e incluídas no CP e o agravamento dos crimes de injúria e difamação a pessoa particularmente indefesa, em razão de idade, deficiência, doença ou gravidez, e do crime de burla.

Assim, caso a Iniciativa Legislativa tivesse sido aprovada, teria sido criado o Artigo 201.°-A, com a epigrafe “Idosos”, onde em cinclo alíneas seriam tipificados cinco novos tipos de crime.

“Quem:

  1. Lavrar ato notarial que envolva pessoa idosa que se encontre, à data, notoriamente limitada ou alterada nas suas funções mentais, em termos que impossibilitem a tomada de decisões de forma autónoma ou esclarecida, sem que se mostre assegurada a sua representação legal;
  2. Coagir uma pessoa idosa que se encontre, à data, notoriamente limitada ou alterada nas suas funções mentais, em termos que impossibilitem a tomada de decisões de forma autónoma ou esclarecida, a outorgar procuração para fins de administração ou disposição dos seus bens;
  3. Negar o acolhimento ou a permanência de pessoa idosa em instituição pública ou privada destinada ao internamento de pessoas idosas, por recusa desta em outorgar procuração para fins de administração ou disposição dos seus bens ou em efetuar disposição patrimonial a favor da instituição em causa;
  4. Abandonar pessoa idosa em hospitais ou outros estabelecimentos dedicados à prestação de cuidados de saúde, quando a pessoa idosa se encontre a cargo do agente;
  5. Impedir ou dificultar o acesso de pessoa idosa à aquisição de bens ou à prestação de serviços de qualquer natureza, em razão da idade; é punido com pena de prisão até dois anos ou com pena de multa até 240 dias.”

Seriam também alterados o artigo 184.° agravando os artigos 180.º, 181.º e 183.º e o artigo 218.° com a introdução de uma nova alínea “A atuação envolver um plano, campanha ou promoção destinados a induzir alguém a adquirir bens ou serviços que não solicitou previamente, executada através de contactos telefónicos da iniciativa do promotor do plano, campanha ou promoção”.

Em artigos anteriores já abordamos o fenómeno da criminalidade praticada contra idosos, e apesar da população idosa representar agora quase um quarto da população, menos de 10% foi vítima de crime, verificando-se assim a existência de uma baixa incidência criminal sobre a população idosa, concluindo-se que os idosos não denunciam os crimes de que são vítimas, nomeadamente os crimes de maus tratos, fraudes, burlas, “contos do vigário” e exploração financeira.

Mesmo concordando com a criminalização das condutas atrás referidas, consideramos que o trabalho deve continuar a ser direcionado para a prevenção, especialmente na sensibilização e informação junto da população idosa, para que denunciem todos os crimes de que são vítimas, sabendo que os autores são quase sempre membros da sua família ou que estão muito próximos, ou seja maioritariamente os idosos são vítimas daqueles que tem a responsabilidade deles cuidar e dai advém a principal dificuldade do idoso em formalizar a denúncia.

Consideramos ainda que qualquer estratégia de protecção aos idosos deve envolver todas as instituições que trabalham nessa área, porque são essas instituições de primeira linha, que conhecem a realidade da população idosa e que podem encontrar na rede uma solução para esses problemas.


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