O novo ano letivo 2023/2024 iniciou-se ontem dia 12 de setembro, constituindo um acontecimento que afeta toda a sociedade, especialmente a comunidade escolar, mas este ano letivo inicia-se assombrado com o aumento da violência juvenil e nem por isso as medidas apresentadas se revelam capazes de prevenir e de combater o fenómeno.
Coronel da GNR
Mestre em Direito e Segurança e Auditor de Segurança Interna
De acordo com o Relatório Anual de Segurança Interna de 2022 (RASI 2022), foram registados 6.607 “ilícitos em ambiente escolar” durante o ano letivo 2021/2022, correspondendo a mais 35%, sendo destes, 4.634 crimes (+93,3%), tendo ainda as ocorrências relacionadas com a violência juvenil (atos criminosos cometidos por jovens entre os 12 e os 16 anos), aumentado em 51% no ano passado, representando mais de 1.700 casos, constituindo o valor mais elevado dos últimos sete anos.
Perante estes números, e também com o objetivo de combater o fenómeno da violência juvenil, ou não, foram entretanto publicados dois diplomas, tendo o primeiro sido publicado a 9 de agosto, através da Resolução do Conselho de Ministros n.º 91/2023, que aprova a Estratégia Integrada de Segurança Urbana (EISU), prevendo o mesmo para combater a violência juvenil, a criação do programa de policiamento de proximidade denominado “Ensino Superior Seguro”.
E a 28 de agosto foi a vez da Lei n.º 51/2023 (apesar de atrasada um ano), veio definir os objetivos, prioridades e orientações da política criminal para o biénio de 2023-2025, e que para prevenir, reprimir e reduzir a violência juvenil, atribui à violência juvenil e a que for praticada em ambiente escolar, a qualidade de crime de prevenção e de investigação prioritária.
Da leitura dos dois diplomas referidos, conclui-se que para prevenir a violência juvenil foi criado o programa especial de policiamento de proximidade denominado “Ensino Superior Seguro”, sabendo que desde 1992 existe o Programa Escola Segura (PES) e mais recentemente o programa “Universidade Segura”, este último criado em 2017, e que a violência juvenil passa a ser um fenómeno de prevenção e investigação prioritária, rótulo também atribuído à violência doméstica já há alguns anos e nem por isso deixou de ser o fenómeno criminal que mais aumenta todos os anos.
Assim, é fácil considerar que as medidas apresentadas revelam-se insuficientes, para prevenir e combater o fenómeno da violência juvenil, especialmente em ambiente escolar, sugerindo em alternativa, a aposta no reforço do PES, porque para além de ser um programa que já deu provas da sua eficácia, ao longo dos últimos 31 anos, é um programa que atua na prevenção de comportamentos antissociais e criminosos entre os jovens, promovendo, não só um ambiente escolar seguro e saudável, como permite a presença policial nas imediações das escolas onde pode dissuadir a violência juvenil.
A aposta no PES, passa por potenciar a capacidade da intervenção precoce através dos elementos afetos ao programa, uma vez que estão em contato direto com os jovens, permitindo-lhes identificar sinais precoces de comportamento problemático ou situações de risco, possibilitando a sinalização precoce dos jovens em risco.
Aumentar as ações de sensibilização, porque o PES além de lidar com questões de segurança, também desempenha um papel educativo, consciencializando os jovens sobre temas como bullying, violência no namoro, consumo de drogas e educação para a cidadania, promovendo a importância de valores cívicos e éticos entre os jovens, contribuindo para a formação de cidadãos responsáveis, onde a colaboração com diretores, professores e funcionários, se tem revelado fundamental para o sucesso do PES.
Aproveitar as capacidades dos elementos afetos ao PES, na mediação de conflitos, sabendo que em situações de conflito entre alunos, esses elementos podem desempenhar um importante papel de mediadores, ajudando a resolver disputas de maneira pacífica e evitando que escalem para a criminalidade, bem como na recolha de informações mais profícua, elaborando análises dos dados recolhidos, com o objetivo de identificar áreas com elevadas taxas de violência juvenil, de forma a direcionar recursos de forma eficaz para esses locais.
Potenciar as parcerias interinstitucionais existentes e criar novas, trabalhando em estreita colaboração com todas as instituições, nomeadamente nas áreas do serviço social, educação e saúde, para identificar e atender às necessidades dos jovens em risco, sendo as Comissões de Proteção de Crianças e Jovens em Perigo um fórum por excelência, onde se reúnem todas as instituições de primeira linha.
Através do reforço do patrulhamento de visibilidade executado pelo efetivo do dispositivo territorial, implementar novas estratégias de patrulhamento, adaptadas à prevenção da violência juvenil, com especial incidência em áreas de concentração de jovens, como por exemplo os centros comerciais e outros espaços públicos, onde também os elementos da investigação criminal, poderão ter um papel na investigação e detenção de jovens envolvidos em atividades criminosas, garantindo que os direitos dos mesmos são respeitados e que tenham acesso a serviços de apoio quando necessário, devendo a jusante serem desenvolvidos programas de reintegração para jovens infratores, fornecendo oportunidades de educação, formação e reabilitação.
Sem esquecer a necessária formação continua dos elementos afetos ao PES, proporcionando-lhes conhecimentos e competências para lidar com as questões relacionadas com os jovens e o seu envolvimento em atividades criminosas, bem como na área da comunicação, necessárias à realização de ações de sensibilização sobre os perigos e consequências da violência juvenil, onde deve ser incentivada a denúncia do fenómeno.
Assim, em vez de medidas redundantes, para prevenir e combater a violência juvenil em Portugal, para além da aposta no reforço do PES, gostaríamos ainda de ver uma abordagem multifacetada, combinando políticas públicas em diversas áreas, nomeadamente no investimento em programas educacionais que visem melhorar o acesso à educação de qualidade e oportunidades de formação profissional para jovens, com a criação de programas de emprego e estágios, promovendo a sua integração no mercado de trabalho e reduzindo a tentação de atividades criminosas.
Desenvolver serviços de apoio social que ajudem os jovens em situações de risco, incluindo aconselhamento, apoio psicológico e programas de reabilitação, devendo ainda ser implementados programas de prevenção do uso de drogas, álcool e violência entre os jovens, com foco na educação e sensibilização, onde a intervenção precoce se revela essencial, com o objetivo de identificar jovens em risco o mais precocemente possível, oferecendo-lhes orientação e apoio familiar.
E apostar na colaboração entre instituições da sociedade civil e comunidades locais, para o desenvolvimento de soluções eficazes de prevenção e combate à violência juvenil, onde a educação para a cidadania assume um papel primordial, através da promoção dos valores de respeito, responsabilidade e inclusão social, nas escolas e na comunidade.
Em resumo, em vez de medidas redundantes, consideramos que a aposta no reforço do PES só por si revela-se mais eficaz, porque o mesmo tem desempenhado ao longo de 31 anos um papel crucial na prevenção e combate à violência juvenil, especialmente em ambiente escolar, ao promover a segurança nos estabelecimentos de ensino, ao intervir precocemente em situações de risco e ao educar os jovens para a importância de comportamentos adequados e éticos, fortalecendo a colaboração entre todas as instituições, especialmente entre a comunidade escolar e as Forças de Segurança, criando um ambiente propício para abordar este desafio complexo que é prevenir e combater a violência juvenil.