DESAFIOS PERSISTENTES E CAMINHOS PARA O FUTURO NA PROTEÇÃO DE CRIANÇAS E JOVENS


Aproveitando o facto que no próximo dia 1 de junho se comemora o “Dia Mundial da Criança”, o artigo desta semana dá a conhecer o “Relatório Anual da Avaliação da Atividade das CPCJ de 2024”, da responsabilidade da Comissão da Nacional de Promoção dos Direitos e Proteção das Crianças e Jovens (CNPDPCJ).

Rogério Copeto

Coronel da GNR, Mestre em Direito e Segurança e Auditor de Segurança Interna

Dirigente da Associação Nacional de Oficiais da Guarda

O Relatório Anual da Avaliação da Atividade das CPCJ de 2024 evidencia o compromisso contínuo das Comissões de Proteção de Crianças e Jovens (CPCJ) com a salvaguarda dos direitos da infância e juventude, denunciando os dados recolhidos fragilidades estruturais e operacionais que exigem atenção imediata para garantir uma resposta eficaz às situações de risco e perigo.

Já mais do que uma vez, abordámos aqui no LN, o tema da proteção de crianças e jovens em perigo, nomeadamente o importante e imprescindível papel que as Forças de Segurança (FS) desempenham no Sistema de Proteção de Crianças e Jovens em Perigo (Sistema de Proteção), e que existe em Portugal há 24 anos, verificando-se que são as FS as entidades que mais comunicaram situações de crianças em perigo em 2024, representando 42,0% do total, seguindo-se os Estabelecimentos de Ensino, com 18,5%, sendo a Negligência a categoria mais comunicada, com 19.107 casos, representando 30,4% do total, seguindo-se a Violência Doméstica (VD), com 17.295 casos em 2024, representando 27,5% do total, e uma diminuição de 1,6% face a 2023.

Como prova da importância das FS no Sistema de Proteção verifica-se que as mesmas colaboraram com todas as 312 CPCJ instaladas, sendo a entidade que alcança a mais alta percentagem de eficácia, com 99,7%, tendo apenas uma CPCJ considerado a articulação pouco eficaz, enquanto 106 avaliaram como eficaz e 205 como muito eficaz.

Apesar de ser um acérrimo defensor do Sistema de Proteção, tendo inclusive já por inúmeras vezes sugerido, a criação de um Sistema semelhante para prevenção e combate ao fenómeno da VD, o mesmo apresenta diversos problemas, que pretendemos elencar e apresentar as respetivas soluções.

A primeira problemática é a sub-representação nas CPCJ, onde apenas 27% das comissões apresentavam composição completa, o que compromete a representatividade e o funcionamento das mesmas, faltando especialmente representantes da sociedade civil, como associações juvenis, desportivas e culturais.

O aumento das sinalizações de perigo em 2024, constitui outro desafio, tendo as CPCJ recebido 58.436 comunicações de perigo, com destaque para casos de negligência (30,4%) e VD (27,5%), registando-se ainda um aumento dos comportamentos antissociais na infância e juventude, que representam 18,8% das comunicações, assim como o aumento das intervenções cautelares e das medidas protetivas, tendo sido aplicadas 1.037 medidas cautelares e 13.813 medidas de promoção e proteção, sendo que a maioria decorre de negligência e VD, verificando-se no entanto, um decréscimo no número total de crianças diagnosticadas com necessidade de medida.

Uma problemática recorrente são as deficiências nas infraestruturas e do apoio logístico, verificando-se que muitas CPCJ não dispõem de instalações acessíveis, salas adequadas para audições ou equipamentos básicos como computadores e impressoras, onde a falta de seguros e viaturas também dificulta o desempenho das suas funções.

Por último constatam-se insuficiências na formação e articulação institucional, apesar de uma avaliação global positiva, cerca de 22% das CPCJ referiram dificuldades na articulação com outras entidades, destacando-se a necessidade de respostas mais céleres e eficazes por parte da CNPDPCJ.

Como medidas para solucionar os problemas indicados, propõe-se o reforço da representatividade das CPCJ, devendo ser adotadas campanhas de sensibilização e incentivos (formação, apoio técnico, reconhecimento institucional) para motivar a sociedade civil a integrar as CPCJ, sobretudo em áreas de menor presença associativa.

A melhoria da capacidade de resposta, poderá ser conseguida através da criação de equipas multidisciplinares móveis, especialmente em territórios onde não há CPCJ instaladas, de forma a assegurar cobertura total e intervenções mais céleres.

É imperativo o investimento em infraestruturas de forma a garantir que todas as CPCJ possuam o mínimo de condições de funcionamento, devendo os municípios cumprir plenamente a sua responsabilidade de fornecer espaços adequados, equipamentos e recursos humanos.

No que diz respeito à necessidade de formação, esta deve ser contínua e especializada, devendo a CNPDPCJ continuar a promover formação técnica contínua, focada em temas como trauma, abuso sexual, intervenção em contexto multicultural, e uso das plataformas digitais para gestão dos processos.

Sobre o aperfeiçoamento da articulação interinstitucional, propõe-se a criação de protocolos operacionais com metas claras entre as CPCJ e as entidades com competência em matéria de infância e juventude, com monitorização regular e avaliação de eficácia.

Para sensibilização e prevenção comunitária, deve-se apostar em ações preventivas junto da comunidade, como é exemplo a “Campanha de abril contra os maus-tratos”, devendo ser reforçada, integrando escolas, serviços de saúde e organizações locais.

Conclui-se que o Relatório Anual da Avaliação da Atividade das CPCJ de 2024, é uma chamada de atenção para a complexidade crescente dos problemas que afetam crianças e jovens em Portugal, tendo as CPCJ demonstrado dedicação e esforço notáveis, mas a eficácia do Sistema de Proteção depende de um investimento continuado e estruturado, cuja defesa do superior interesse da criança exige não apenas respostas protetivas, mas também uma cultura nacional de responsabilidade partilhada, onde Estado, famílias e sociedade civil atuem em verdadeira parceria.

Nota: O texto constitui a opinião exclusiva e única do seu autor, que só a este vincula e não refletem a opinião ou posição da instituição onde presta serviço.


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