No próximo dia 8 de março, assinala-se o “Dia Internacional da Mulher” e por isso o presente artigo pretende abordar o assunto da baixa taxa de feminização das Forças de Segurança (FS), após 53 anos do ingresso das primeiras mulheres no dispositivo da Polícia de Segurança Pública (PSP) e 30 anos que o mesmo aconteceu na Guarda Nacional Republicana (GNR), numa altura em que as taxas de recrutamento são as mais baixas de sempre.
Coronel da GNR
Mestre em Direito e Segurança e Auditor de Segurança Interna
Provavelmente como é tradição no “Dia Internacional da Mulher” irão ser divulgadas mais medidas para atrair as mulheres para as FS, tal como aconteceu no dia 7 de março de 2021, quando o Expresso divulgou no artigo “MAI impõe mínimo de mulheres no recrutamento para GNR e PSP (15% e 20%)”, onde constava que “O Ministério da Administração Interna vai incluir nas regras de recrutamento em 2021 indicadores mínimos de 15% de mulheres na incorporação para guardas da GNR e de 20% para agentes da PSP”.
Mas passados três anos verificamos que na Cerimónia de Juramento de Bandeira do 54.º Curso de Formação de Guardas da GNR, realizada no passado dia 15 de fevereiro, prestaram juramento perante o Estandarte Nacional, 11 mulheres e 163 homens, representando uma taxa de 6,32% de mulheres e na Cerimónia de Compromisso de Honra do 52.º Curso de Formação de Guardas da GNR, realizado em 4 de outubro de 2023, dos 223 Guardas 16 eram mulheres, representando 7,17% de taxa de feminização.
A única boa notícia vem da PSP, quando no último Curso de Formação de Oficiais daquela FS, que terminou em junho do ano passado, terminaram o curso 13 mulheres, no total de 28 oficiais, representando uma taxa de feminização de 46,52%.
No que diz respeito á taxa de feminização existentes em ambas as FS, verifica-se após consulta do “Relatório de Atividade da GNR de 2022”, que em 31 de dezembro de 2022, contabilizavam-se 23.684 trabalhadores em efetividade de funções, sendo 22.874 militares (96,58% do efetivo), divididos em 21.468 homens (90,64%) e 2.216 mulheres (9,36%), cuja taxa de feminização é 9,36%, apesar de dessa taxa ter crescido nos últimos 20 anos, quando em 2000 era de 1%, com de 214 mulheres no seu efetivo.
Já na PSP e após consulta do “Balanço Social da PSP de 2022”, verifica-se que a 31 de dezembro 2022, existiam um número total de 21.605 trabalhadores, sendo que o efetivo policial era de 20.262 elementos policiais, que constituem 93,78% da totalidade dos recursos humanos desta FS. Na distribuição dos trabalhadores da PSP por género, verifica-se que o género masculino representa 89,14% e o género feminino apresenta 10,86%, do efetivo policial e do efetivo sem funções policiais, correspondendo assim a taxa de feminização de 10,86%.
Sobre medidas publicas para o aumento da taxa de feminização das FS, consultámos a Resolução do Conselho de Ministros n.º 61/2018 de 21 de maio que aprova a “Estratégia Nacional para a Igualdade e a Não Discriminação 2018-2030”, onde constam duas medidas da responsabilidade da GNR e da PSP, que a seguir se transcrevem: “Estudo sobre a situação das mulheres nas forças de segurança” a realizar no presente ano de 2024 e a “Realização de ações de sensibilização tendo em vista aumentar o n.º de mulheres nas forças de segurança (em articulação com o Plano de Prevenção de Manifestações de Discriminação nas Forças e Serviços de Segurança)”, cuja meta é realizar duas ações em cada um dos anos de 2023, 2024, 2025 e 2026.
Pelo exposto conclui-se que até ao fim do ano será divulgado um estudo sobre “A situação das mulheres nas forças de segurança” e no que diz respeito ás ações de sensibilização tendo em vista aumentar o n.º de mulheres nas FS, não encontrámos nenhuma referência online, destas ações no ano de 2023, não se podendo concluir por isso que as mesmas não foram realizadas, no entanto seria muito estranho que tivessem sido realizadas pela GNR e pela PSP e não tenham sido amplamente divulgadas por ambas as FS nas suas plataformas digitais e noticiadas por vários órgãos de comunicação social.
Mas se em Portugal a taxa de feminização nas FS é baixa, basta-nos espreitar a nossa vizinha em Espanha, para perceber que o problema é semelhante, mas que nas medidas adotadas poderá ser um exemplo a seguir. Senão vejamos.
Na Guardia Civil (GC) a taxa de feminização em 2022 era de 8,75%, tendo a primeira mulher integrado aquela FS em 1988 e na Polícia Nacional (PN) no mesmo ano era de 16,69%, cujas primeiras mulheres entraram em 1979, pelo que a GC e a PN implementaram um conjunto de medidas em 2022, para atingir o objetivo de ter pelo menos 40% de mulheres nos concursos de recrutamento em ambas as FS antes de 2030.
Para isso a GC anunciou a reserva de uma percentagem das vagas para mulheres em todos os seus processos de seleção, consistindo na fixação, em cada processo de recrutamento aos cursos de guardas, uma percentagem de vagas reservadas para mulheres, que em cada convocatória oscilará entre um mínimo de 25% e um máximo de 40%, e para garantir a percentagem de vagas reservadas às mulheres, estas terão preferência sobre os candidatos do sexo masculino desde que, após aprovação no exame de acesso, a diferença de pontos entre os dois não seja superior a 15%.
Já a PN eliminou a exigência da altura mínima para as mulheres, que estava fixada em 1,60 mtr, o que representava uma discriminação para as mulheres por ser desproporcional à sua altura média, bem como os obstáculos de acesso, que as mulheres tinham por motivos de gravidez, parto ou pós-parto, podendo as mulheres que pretendam ingressar na PN adiar as suas provas de seleção se estiverem grávidas, em trabalho de parto ou pós-parto, ou mesmo o inicio do curso após a aprovação nos testes de admissão.
Neste caso de adiamento, tanto as mulheres como os homens que adiem a sua incorporação no curso de ingresso por motivo de gravidez, nascimento, adoção ou acolhimento de menor serão inscritos como “funcionários públicos em formação”, pelo que a sua antiguidade na PN não será prejudicada.
Para além destas medidas, já implementadas nas congéneres espanholas que poderão ser seguidas pelas nossas FS e aquelas que constam na Estratégia Nacional para a Igualdade e a Não Discriminação 2018-2030, podemos ainda propor, para aumentar a taxa de feminização nas nossas FS, a implementação de campanhas de recrutamento nas escolas secundárias direcionadas especificamente para as jovens mulheres que estejam a terminar o secundário, onde se destacariam as oportunidades de carreira nas FS, os benefícios de ingressar na GNR e na PSP, quais as diferentes carreiras e oportunidades disponíveis, cujas ações de sensibilização seriam também elas realizadas por mulheres da GNR e da PSP.
Outra iniciativa que se propõe é a criação de medidas de apoio durante todo o processo de recrutamento, fornecendo orientação e apoio personalizado durante todo o processo de seleção e também durante os respetivos cursos de formação, de modo a garantir que as mulheres se sintam apoiadas e incentivadas, devendo esse apoio se prolongar durante a sua carreira, onde o reforço das medidas de conciliação entre o trabalho e a vida pessoal, terão um papel fundamental na atração e na retenção das mulheres nas FS.
Conjuntamente com o reforço da promoção da igualdade de género, deverá promover-se uma cultura organizacional inclusiva e igualitária, onde as mulheres se sintam valorizadas e respeitadas em todos os níveis, pelo que estamos em crer que a execução destas medidas, que requerem um compromisso contínuo por parte das lideranças de ambas as FS, bem como a colaboração com outras entidades e organizações terão como resultado o aumento da taxa de feminização nas FS, porque isso tornará as FS mais eficientes, mais justas e mais próximas, e isso se traduzirá naturalmente em sociedades mais justas, pacíficas e prósperas.