Opinião (Rogério Copeto): EQUIPAS DE ANÁLISE PROSPETIVA EM VIOLÊNCIA DOMÉSTICA


Proposta de lei pretende alterar o regime jurídico de prevenção da violência doméstica, proteção e assistência às suas vítimas. Constituiu-se desde 2009 como o instrumento legal fundamental na protecção das vítimas de violência doméstica.

ROGER COPETO-800x800Rogério Copeto

Tenente-coronel da GNR, Mestre em Direito e Segurança e Auditor de Segurança Interna

Chefe da Divisão de Ensino/ Comando da Doutrina e Formação

Na última 5ª-feira, dia 7 de maio, o Conselho de Ministros aprovou uma proposta de lei que pretende alterar pela terceira vez, o regime jurídico de prevenção da violência doméstica, proteção e assistência às suas vítimas (Lei nº 112/2009 de 16 de Setembro), que se constitui desde 2009 como o instrumento legal fundamental na protecção das vítimas de violência doméstica, tendo nessa altura tido como principal novidade a criação do “Estatuto de Vítima” para as vítimas de violência doméstica.

À semelhança das alterações anteriores, a referida proposta prevê também algumas novidades, tendo os Órgão de Comunicação Social dado destaque ao facto da mesma prever a criação de uma base de dados, como principal inovação.

Mas esta proposta de alteração à Lei nº 112/2009 não prevê só a criação de uma base de dados, nem esse facto constitui a maior novidade, porque as Forças de Segurança já disponham de uma base de dados, da responsabilidade do Ministério da Administração Interna e alimentada pela GNR e pela PSP, da qual se retiram todos os anos, os dados estáticos para inclusão no Relatório Anual de Segurança Interna sobre violência doméstica.

Esta proposta de Lei tem como principal objectivo o reforço dos mecanismos de proteção da vida e segurança das vítimas, e o aprofundando das medidas de apoio à sua reinserção no meio social e laboral e para além da criação da referida base de dados, reorganiza a rede nacional de apoio às vítimas de violência doméstica, integrando o acolhimento de emergência, reforçando-se os mecanismos de articulação das várias entidades que integram a rede, passando também as vitimas a ter prioridade no acesso às ofertas de emprego e a atendimento prioritário, em condições de privacidade, nos centros de emprego, para além do acesso preferencial das vítimas aos programas de formação profissional, e reforça a intervenção dos órgãos de polícia criminal, prevendo que possam adotar procedimentos para a proteção policial das vítimas, a partir de um plano individualizado de segurança elaborado em função do nível de risco de reincidência do agressor, com base na nova ficha de avaliação de risco em violência doméstica.

A “ficha de avaliação de risco” também não constitui nenhuma novidade, uma vez que já está a ser usada pelos órgãos de polícia criminal e pelo Ministério Público e tem como objectivo facilitar a análise das situações concretas de violência doméstica, introduzindo uma maior objetividade, identificando o nível de risco presente e assim melhor orientar a intervenção policial no sentido de promover a segurança das vítimas. Este instrumento permite avaliar o risco de forma rápida e prática, de modo a perceber qual o nível de risco associado à vítima de violência doméstica, podendo ser elevado, médio ou baixo e que de acordo com o nível de risco, deverão ser executadas determinadas medidas de segurança de proteção às vítimas, acreditando que este instrumento de avaliação de risco em casos de violência doméstica poderá salvar vidas.

Mas o que consideramos realmente inovador é criação de uma “Equipa de Análise Retrospetiva de Homicídio em Violência Doméstica”, destinada a reforçar a prevenção da violência doméstica e, em particular, dos homicídios, e tem como principal missão, propor novos procedimentos ou metodologias preventivas.

Para legitimar a criação desta equipa é aditado à Lei nº nº 112/2009 o artº 4º-A, onde se prevê no seu nº 1 que “os serviços da Administração Pública com intervenção na proteção das vítimas de violência doméstica realizem uma análise retrospetiva das situações de homicídio ocorrido em contexto de violência doméstica e que tenham sido já objeto de decisão judicial transitada em julgado ou de decisão de arquivamento, visando retirar conclusões que permitam a implementação de novas metodologias preventivas ao nível dos respetivos procedimentos, sendo a mesma composta por: Um/a representante designado pelo Ministério da Saúde; Um/a representante designado pelo Ministério da Solidariedade, Emprego e Segurança Social; Um/a representante da Secretaria-Geral do Ministério da Administração Interna; Um/a representante da Comissão para a Cidadania e a Igualdade de Género; Um/a representante do Ministério Público e; Um/a representante da força de segurança territorialmente competente na área em que tiver sido praticado o crime. Sendo no entanto ainda necessário, para regulamentar esta equipa a aprovação de uma portaria, pelos membros do Governo responsáveis pelas áreas da administração interna, da cidadania e da igualdade de género, da saúde, da justiça e da segurança social.

Como o próprio nome indica, esta equipa tem como missão realizar uma análise a todos os processos-crime por homicídio ocorridos em contexto de violência doméstica, transitados em julgado, independentemente do resultado do mesmo, olhando para o passado, com a preocupação de conhecer a intervenção de todas as instituições que desempenharam um papel naquela ocorrência, da qual resultou uma ou mais mortes.

De acordo com o referido artigo, e apesar de não se conhecer ainda a portaria que regulamentará esta equipa, a mesma não terá como responsabilidade avaliar a intervenção das instituições que trabalharam no caso, tais como as entidades de apoio, os órgãos de polícia criminal ou o Ministério Público, mas tão-somente conhecer os actos ou omissões que tiveram como consequência a morte daquela vitima, para que se possam corrigir procedimentos, com o objectivo de prevenir os homicídios em contexto de violência doméstica, que constituem as ocorrências mais graves, e por isso todas as iniciativas que possam ser introduzidas para prevenir esse tipo de crimes, são de louvar.

Conforme já atrás referido, parece-nos que a maior inovação desta proposta de Lei é criação desta “Equipa de Análise Retrospectiva”, mas poderia ser ainda mais inovadora, se prevê-se a criação de equipas multidisciplinares de âmbito local, que acompanhassem todas as ocorrências de violência doméstica, avaliadas como de risco médio ou elevado, através da ficha de avaliação de risco, desde o momento da apresentação da queixa, tendo como a missão conhecer quais os procedimentos que foram tomados, que na sua perspectiva não foram os mais correctos, propondo em tempo oportuno a sua correção ou a implementação de procedimento que não terá sido tomado, podendo-se dessa forma ir a tempo de salvar a vida daquela ou daquelas vitimas.

Esta ideia não é original, existindo noutros países e com provas dadas, aguardando-se por isso uma nova alteração da Lei nº 112/2009, achando que se perdeu agora uma boa oportunidade para se criarem estas Equipas de Análise Prospectiva.


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