QUEIXAS CONTRAS OS ELEMENTOS DAS FORÇAS DE SEGURANÇA


O uso da força é um instrumento indispensável a qualquer Estado, cuja responsabilidade pela sua aplicação é atribuída aos seus funcionários, especialmente aos responsáveis pela aplicação da lei, fardados ou não, que exerçam poderes policiais, em especial poderes de captura e de detenção.

Rogério Copeto

Coronel da GNR

Mestre em Direito e Segurança e Auditor de Segurança Interna

Para isso todos os funcionários responsáveis pela aplicação da lei, ou seja, os agentes da lei, juram respeitar a Constituição e demais leis da República, mesmo com o sacrifício da própria vida, sendo que a sua responsabilidade para com a sociedade vai muito para além da aplicação da lei, onde não raras vezes, têm também de usar a força, sempre que necessário.

Esta introdução serve para falar de queixas contra os elementos das Forças de Segurança (FS), que ontem, dia 3 de outubro, foi notícia na maioria dos órgãos de comunicação social, que divulgaram um estudo da Inspeção Geral da Administração Interna (IGAI), cujas denúncias passaram de 772 em 2017, para 1436 em 2022, verificando-se que as queixas praticamente duplicaram em seis anos.

De acordo com a IGAI em 2022, 48% das queixas contra os elementos das FS tiveram origem na violação de deveres de conduta, as ofensas à integridade física correspondem a 14,3%, os assuntos de natureza interna ou profissional representa 6,6%, a violência doméstica representa 3,2% e as relacionadas com práticas discriminatórias 1%, não tendo sido registadas em 2022 queixas por detenção ilegal ou por morte.

Concluindo-se assim, que apesar de ser censurável e negativa a realidade portuguesa, é também diferente daquela que se verifica na maioria dos restantes países, constatando-se que as queixas contra os elementos das FS estrangeiras surgem maioritariamente devido ao uso excessivo de força, nomeadamente alegações de que os agentes usaram força desnecessária ou excessiva durante uma determinada abordagem ou detenção. A discriminação racial, étnica, de género, religiosa ou outras formas de preconceito também são motivo de queixas, assim como o abuso verbal, através de linguagem abusiva, ameaças ou insultos durante a interação com os cidadãos.

Verifica-se que na nossa realidade são raras as detenções ilegais, não tendo existido nenhuma queixa em 2022, bem como os direitos, liberdades e garantias fundamentais dos cidadãos são respeitados, onde se incluem o direito à liberdade de expressão ou de reunião e manifestação, ao contrário do que acontece noutros países, onde não raras vezes são apresentadas queixas por realização de identificações, revistas ou detenções baseadas na raça ou apenas na origem étnica de um individuo.

Nesta altura, é importante relembrar que para o cumprimento da sua missão, os elementos das FS estão sujeitos a todas as regras que qualquer cidadão está obrigado, para além daquelas que internamente os regem, tais como o estatuto profissional, o código deontológico e o regulamento de disciplina, que os obrigam a observar um conjunto de deveres e que lhes limitam os direitos, tendo como responsabilidade garantir a segurança de todas as pessoas e bens, durante as 24 horas por dia, 365 dias por ano, faça chuva ou faça sol, nos dias, horas e condições em que o vulgar cidadão se recolhe no aconchego familiar, tendo como única recompensa o reconhecimento da população que serve e a consciência que desenvolve uma profissão essencial num estado de direito democrático, onde sem segurança, não pode existir liberdade.

Também a sociedade nos últimos anos verificou uma evolução, refletindo-se essa evolução na atitude dos cidadãos perante a aplicação da lei e respetivas atuações policiais, exigindo respostas mais moderadas e ponderadas no combate ao crime, em oposição à força musculada, sendo por isso as atuações policiais sujeitas a um maior escrutínio pela sociedade, encontrando-se todos os agentes da lei avisados, ​​de que o público está constantemente a observar o que fazem e como fazem, sem prejuízo desse escrutínio ser necessário para proteger os que cumprem a lei e expor aqueles que não cumprem.

Assim, todas as ações realizadas pelos elementos das FS, especialmente quando usam a força, devem ser avaliadas e analisadas por quem de direito, evitando-se os julgamentos precipitados, até que todos os factos que conduziram à ocorrência sejam conhecidos, porque é especialmente importante julgar essas decisões com base apenas nos factos que foram conhecidos ou percebidos pelo agente da lei durante a ocorrência.

É ainda importante que os elementos das FS usem o bom senso e a devida diligência ao determinar se devem ou não usar a força e exatamente que força usar, porque todos os cidadãos pretendem, legitimamente, que os seus agentes da lei, desempenhem as suas funções com elevados padrões éticos, cabendo-lhes aderir a esse padrão e agir sempre no interesse de salvaguardar vidas e bens, preservando e protegendo, ao mesmo tempo, os direitos de todos, particularmente dos inocentes.

Por isso, sempre que o uso legítimo da força seja inevitável, os elementos das FS deverão: Utilizar a força com moderação e a sua ação deve ser proporcional à gravidade da infração e ao objetivo legítimo a alcançar; Minimizar os danos e as lesões, e respeitar e preservar a vida humana; Assegurar a prestação de assistência e cuidados médicos às pessoas feridas ou afetadas, tão rapidamente quanto possível, e; Assegurar a comunicação da ocorrência à família ou pessoas próximas da pessoa ferida ou afetada, tão rapidamente quanto possível.

Terminamos referindo que nem todas as queixas contra os elementos das FS são fundadas, sendo por isso necessária uma investigação imparcial para determinar a validade das alegações, podendo no entanto ser prevenidas, através da formação, da supervisão, da transparência, da existência de uma política de queixas, da comunicação com os cidadãos, da confiança, da avaliação de desempenho dos agentes policiais e da sua responsabilização, da educação da população, da melhoria de procedimentos e da introdução da mediação entre cidadão e policia.

A prevenção das queixas contra os elementos das FS exige um esforço contínuo para criar FS mais responsáveis e confiáveis, o que beneficia tanto a comunidade quanto os seus elementos.


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