A GNR realizou no entre 1 de outubro e 15 de novembro a “Operação Censos Sénior 2024”, cujos resultados foram divulgados no dia 22 de novembro e no dia 25 de novembro foi assinalado o “Dia Internacional para a Eliminação da Violência Contra as Mulheres”, tendo o número de denúncias de violência doméstica (VD) em Portugal motivado alguma discussão.
Coronel da GNR
Mestre em Direito e Segurança e Auditor de Segurança Interna
Começando pelo assunto das denúncias de VD que foram trazidas a público por motivo do “Dia Internacional para a Eliminação da Violência Contra as Mulheres” e cujo tema terá motivado discussão na sequência das declarações do Primeiro-ministro, conforme referido no artigo da RR de 25 de novembro, “Montenegro: “Não há aumento real” de violência doméstica, há mais denúncias”, onde consta, “Primeiro-ministro diz que “muita coisa saiu do armário em que estava escondida”, mas considera que o crime não é cometido mais vezes. Montenegro diz que sociedade “já foi muito pior”. Dados não permitem tirar essa conclusão”.
Sobre os dados de VD, e tendo como pressuposto que a uma denuncia apresentada às Forças de Segurança (FS) ou a qualquer órgão de polícia criminal (OPC) corresponde a presumível prática de um crime de VD e a elaboração do respetivo auto de notícia, com a atribuição de um número único identificador de processo crime (NUIPC), relembramos que através do Relatório Anual de Segurança Interna de 2023 (RASI 2023), ficámos a saber que foram participados aos OPC, 30.461 crimes de VD, verificando-se uma descida de 0,1% comparativamente com o RASI 2022, quando foram participados 30.488 crimes.
O último relatório anual sobre VD, da responsabilidade da Secretária-geral do Ministério da Administração Interna, é de novembro de 2022, referente ao ano de 2021, denominado “Relatório Anual de Monitorização da Violência Doméstica – 2021” (RAMVD 2021), verifica-se que no ano de 2021, as FS registaram 26.517 participações de VD, 12.754 pela GNR (48,1%) e 13.763 (51,9%) pela PSP, o que correspondeu a uma diminuição face ao RMVD 2020 de -4,0%, ou seja, menos 1.102 denúncias.
Enquanto no “Relatório Anual de Segurança Interna de 2021” (RASI 2021), constam 26.520 crimes de VD registados em 2021 pelas FS e no “Relatório Anual de Segurança Interna de 2020” (RASI 2020) foram registados pelos OPC 27.637 crimes, menos 1.861 que em 2020, a que corresponde uma diminuição de -6,3%.
E de acordo com os dados publicados no portal da violência doméstica, da responsabilidade da Comissão para a Cidadania e a Igualdade de Género (CIG), as denúncias à GNR e à PSP, em 2023, totalizaram 30.279 denúncias e, em 2022 foram 30.389, verificando-se uma descida de 110 denúncias, tendo até setembro de 2024 sido registados 23.032 denúncias e no mesmo período de 2023 foram registadas 23.306, menos 274 denúncias, prevendo-se assim, de acordo com as estatísticas da CIG, que o ano de 2024 termine com uma ligeira diminuição das denúncias.
Também por motivo do “Dia Internacional para a Eliminação da Violência Contra as Mulheres” a GNR e a PSP divulgaram as respetivas estatísticas de VD, tendo o artigo da RR, de 25 de novembro, com o titulo “GNR registou mais de 12 mil crimes de violência doméstica em 2024”, dado eco aos dados da GNR, que “registou 12.283 crimes de violência doméstica entre janeiro e outubro” e no artigo do JN, também de 25 de novembro, com o titulo “Mais de 75 mil crimes de violência doméstica registados pela PSP em quatro anos”, a PSP dá conta que “contabiliza 75.380 ocorrências de violência doméstica entre 2019 e 2023, um crime que tem vindo a aumentar”.
Em resumo, podemos concluir que existem pelo menos de três formas de divulgação das denúncias de VD, conforme já referido, sendo eles o RASI, o RAMVD e o “portal da violência doméstica”, para além dos dados que são divulgados pela GNR e PSP, isoladamente, o que torna a análise do fenómeno mais difícil, podendo no entanto concluir-se, através dos dados do RASI, por considerarmos serem os mais fidedignos, porque inclui os contributos de todos os OPC e não só das FS, que nos últimos 10 anos, entre 2014 e 2018 a VD manteve-se relativamente estável entre os 26.500 e os 27.300 crimes, tendo em 2019 aumentado para perto do 29.500, descido nos anos da pandemia de COVID19 para cerca de 26.500 crimes, aumentando em 2022 para perto dos 30.500 e mantendo-se nesses valores em 2023.
Pelo exposto e tendo em conta a dispersão de fontes sobre VD, é urgente a entrada em funcionamento da Base de Dados de Violência contra as Mulheres e Violência Doméstica (BDVMVD), que reuna todos os dados recolhidos pelos OPC, verificando-se que possivelmente ainda não será em 2024, conforme consta no RASI 2023 que “foi lançado procedimento concursal para aquisição de serviço de desenvolvimento da BDVMVD”, propondo-se que no futuro, a comparação seja feita por analogia à que se faz para a sinistraldade rodoviária, ou seja os anos de 2020 e 2021 não sejam considerados para efeitos de comparação, devendo essa comparação ter como referência o ano de 2019, pelo que os anos de 2022 e 2023 ao serem comparados com 2019, verifica-se um aumento dos crimes de VD em 2022 e 2023 comparativamente a 2019, prevendo-se que em 2024 as deúncias continuem acima das verificadas em 2019.
Para terminar, abordamos o tema dos idosos isolados, conforme nos propusemos no titulo do presente artigo, para dar conta que a GNR realizou entre 1 de outubro e 15 de novembro, a “Operação Censos Sénior 2024”, com o objetivo de combater a solidão e o isolamento dos idosos, e prevenir situações de perigo, tendo sido registados 42.873 idosos a viver sozinhos ou isolados na zona de ação da GNR, que ocupa 94% do território nacional.
O trabalho que a GNR desenvolve durante a “Operação Censos Sénior”, nasceu da necessidade de combater o isolamento e a solidão da população idosa, procedendo a GNR desde 2011 à sinalização de idosos isolados e sozinhos, encaminhando as situações de maior perigo, para as instituições de apoio aos idosos, tendo nesse ano sinalizado 15.596 idosos em todo o território nacional à responsabilidade da GNR.
A GNR para além de sinalizar os idosos, realiza ações de sensibilização e informação sobre os procedimentos de segurança a observar em situações de maus-tratos, assalto ou burla, bem como a forma como poderão denunciar os crimes de que são vítimas, disponibilizando para o efeito os números de telemóvel dos militares da GNR, criando-se assim laços de confiança entre a GNR, os idosos e seus familiares, cujo principal objetivo da Operação Censos Sénior é registar todos os idosos que residam sozinhos e isolados, mantendo com os mesmos contactos frequentes e referenciar junto das instituições de apoio à terceira idade, aqueles que se encontrem em situações de maior vulnerabilidade.
A todos os idosos registados é efetuada uma avaliação do risco, sendo que nas situações em que o idoso revela especial situação de vulnerabilidade, o mesmo é sinalizado às instituições respetivas, tendo sido já as centenas de idosos sinalizados e alguns foram literalmente salvos de uma tragédia iminente.
Conclui-se assim, que a GNR realiza um papel preponderante na proteção dos idosos mais vulneráveis, constituindo-se a Operação Censos Sénior como prova bastante de que a GNR cumpre a missão a que está obrigada, indo muito para além do que lhe é exigido, e que só o grande humanismo de todos os militares envolvidos faz com que esta operação seja um sucesso ano após ano, sendo também a confirmação de que a GNR se constitui na face do Estado, que mais próxima e visível está da população mais idosa, e que faz o que mais ninguém faz.
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