Os maus tratos a uma utente do lar da Santa Casa da Misericórdia do Alandroal, que veio a falecer no Hospital de Évora, levou o MP a constituir de 10 arguidos, entre eles a própria instituição.
A diretora técnica, um médico, uma enfermeira, uma técnica de fisioterapia, quatro funcionárias do Lar de Nossa Senhora de Fátima e a provedora e a própria Santa Casa da Misericórdia de Alandroal (SCMA) foram acusados do Ministério Público (MP) do Departamento de Investigação Penal (DIAP) de Redondo, da prática em coautoria de um crime de maus tratos agravado pelo resultado.
Face aquilo que o DIAP considerou que a violação, por parte dos arguidos, dos deveres de cuidados e de cuidados de saúde que deviam ter adotado, causaram lesões a uma utente que viria a falecer no Hospital do Espírito Santo, em Évora, na madrugada do dia 6 de fevereiro de 2015. A acusação sustenta que a morte de Lucinda Rodrigues, de 83 anos, se ficou a dever a uma sepsis – infeção generalizada consecutiva a escaras de pressão e caquexia.
Nos últimos meses de vida, a vítima estava institucionalizada na SCMA e a partir de 19 de dezembro de 2014 foi transferida para o Lar Domus Sénior, em Vendas Novas, e segundo um relatório de um médico e uma enfermeira desta última instituição, no dia da entrada “apresentava diversas úlceras de pressão, a maioria de III grau e exalava um intenso cheiro a carne putrefacta que provinha das mesmas”.
Na sequência de um acidente vascular cerebral (AVC) ocorrido em julho de 2012, a octogenária passou a frequentar o Centro de Dia da SCMA e em outubro de 2014, dado o seu estado de dependência, passou a pernoitar, em regime de internato, no lar da instituição.
Segundo a acusação, a partir dessa data o estado de Lucinda agravou-se, deixou de andar pelos seus meios e passou a deslocar-se em cadeira de rodas, mas, com ajuda de terceiros. À mulher, não era conhecido qualquer historial de úlceras de pressão e muitas das situações ocorridas no lar, não foram reportadas pelas ajudantes no “Livro das Ocorrências”, pelo que a utente não foi levada ao Centro de Saúde para receber tratamento. A conduta destas “colocou em causa a segurança de Lucinda Rodrigues e levou ao agravamento do seu estado de saúde”.
Em outubro de 2014, o filho da utente abordou a técnica de fisioterapia da instituição, avançado com a hipótese de vir uma pessoa da fora da instituição para fazer os tratamentos de reabilitação da progenitora, o que foi rejeitado pela referida profissional que assegurou “ter disponibilidade para os fazer e já estarem os mesmos agendados”.
Dois meses depois e segundo a acusação, foi a técnica que contatou o descendente de Lucinda para a necessidade de ser feito um diagnóstico objetivo e suportado, sobre os tratamentos a fazer. As sessões de fisioterapia foram suspensa face a um surto de escabiose detetado no lar, mas a fisioterapeuta nada comunicou ao médico responsável.
A dedução da acusação pública por parte do MP já foi dada a conhecer aos acusados, sustentando que o mesmo deve ser julgado com a intervenção de um Coletivo de Juízes. Antes do julgamento, os arguidos podem pedir a abertura de instrução do processo.
Provedora: Apesar dos seus deveres de gestão da instituição desconhecia as úlceras de pressão da utente, só tomando conhecimento de tal facto no dia 19 de dezembro quando lhe foio apresento o relatório de alta de Lucinda. Durante o período de férias da enfermeira, esta não foi substituída.
Médico: Como resultado de uma conduta descuidada e imprudente, e apesar de ter conhecimento do estado de saúde da utente, quando elaborou o plano de tratamentos o clínico sabia que a enfermeira ia e férias e nada fez para a substituir, não prevendo nem evitando o desfecho que veio a suceder.
Enfermeira: Nos dias finais da presença da utente no lar da SCMA, a enfermeira não reparou numa lesão na região sagrada, eritema nas costas e maceração numa perna, não observando os deveres de cuidando.
Teixeira Correia
(jornalista)