NA SEGURANÇA ESCOLAR, AGORA COMO HÁ DEZ ANOS


Na última segunda-feira vários foram os órgãos de comunicação social, que deram eco ao comunicado da Polícia de Segurança Pública (PSP), onde deu conta do balanço da violência escolar no último ano letivo, nomeadamente entre 1 de setembro de 2023 e 15 de agosto de 2024, tendo-se registado um aumento de 5,5% das ocorrências, comparativamente com o ano letivo de 2022/23.

Rogério Copeto

Coronel da GNR

Mestre em Direito e Segurança e Auditor de Segurança Interna

Um desses artigos é o que JN publicou no dia 9 de setembro com o título “Escola Segura regista mais de 4000 ocorrências”, onde dava conta que “os agentes do Programa Escola Segura (PES) registaram, no último ano letivo, mais de quatro mil ocorrências, quase três mil das quais de natureza criminal … já no ano letivo 2022/23, as ocorrências nas escolas tinham aumentado cerca de 9%, totalizando 3824, das quais 2444 criminais e 1081 de natureza não criminal.”

Já por várias vezes abordei aqui no LN o fenómeno da violência escolar e do Programa Escola Segura, que as Forças de Segurança (FS) operacionalizam desde 14 de setembro 1992, no âmbito do Policiamento de Proximidade, por conta própria e sem qualquer coordenação, pelo que não é de estranhar, que a uma semana de inicio de um novo ano letivo só sejam conhecidos os dados da PSP, não existindo nenhum relatório, que junte os dados da PSP e da GNR, no que diz respeito ao ano letivo transato.

Provavelmente teremos de esperar até abril de 2025, quando for divulgado o Relatório Anual de Segurança Interna de 2024 (RASI 2024), onde no capitulo “Segurança Escolar” constarão as ocorrências registadas pelas FS no ano letivo 2023/24, conforme consta no RASI 2023, referente ao ano letivo 2022/23, quando as FS registaram 6.821 ocorrências, correspondendo a mais 12,4%, do que no ano letivo 2021/22, concluindo-se assim que a violência escolar aumentou nos últimos dois anos letivos.

Mas sem necessidade de recuar muito no tempo, relembro que nos artigos do CM e do SOL ambos de 27 de novembro de 2016, o primeiro com o título “500 crimes por mês nas escolas” e o segundo denominado “Aumentam crimes nas escolas”, davam conta que o ano letivo de 2015/16, tinha terminado com a ocorrência de 5.051 crimes no interior e nas imediações das escolas de todo o País, representando cerca de 500 por mês e que para esse número muito contribuiu o aumento de crimes verificados na área da PSP, onde se verificaram 4.102 situações, mais 172 que no ano letivo 2014/15, tendo a GNR registado 949 ocorrências.

Curiosamente os dados constantes nos referidos artigos foram divulgados pelo Ministério da Administração Interna (MAI) e confirmavam os dados, que já constavam no RASI 2015.

Por coincidência ou não, também nesse mesmo dia 26 de novembro de 2016, foi noticia na SICN,  que o “Governo vai reativar grupo coordenador da Escola Segura”, dando conta que o MAI pretendia reativar o “grupo coordenador da Escola Segura, para acompanhar a nível nacional as questões de segurança nos estabelecimentos de ensino e propor medidas às tutelas.”

Tal promessa foi cumprida um ano depois através do Despacho n.º 8927/2017, de 10 de outubro, que passou a redefinir as regras do Programa Escola Segura, cuja estrutura organizacional compreende agora um “Grupo Coordenador” e uma “Comissão Consultiva”, sendo responsabilidade do primeiro elaborar um Relatório Anual, conforme consta no art.º 16.º do referido Despacho, devendo “incluir um balanço das principais iniciativas desenvolvidas no seu âmbito e o resultado da análise dos registos de ocorrências de segurança verificadas pela Direção-Geral dos Estabelecimentos Escolares e pelas Forças de Segurança”, sendo apresentado à Comissão Consultiva até 31 de janeiro, não tendo no entanto conseguido consultar nenhum relatório, porque através de uma pesquisa no google, não foi devolvido qualquer resultado.

Para complicar ainda mais o tema, um ano antes, no dia 14 de maio de 2015, o Público dava conta que o “PS pede a reactivação do Observatório da Segurança em Meio Escolar”, por motivo da divulgação de um vídeo de agressões a um rapaz, na Figueira da Foz, que levou o PS a questionar Ministério da Educação sobre o desfasamento de 4.907 ocorrências entre o relatório elaborado pelo Ministério da Educação e o RASI 2014, onde este último apontava para um aumento nas ocorrências de natureza criminal ocorridas em contexto escolar em cerca de 8.1% face ao ano letivo transato de 2012/13, comparativamente com os dados de constantes no relatório elaborado pelo Ministério da Educação referente ao mesmo ano letivo.

A dúvida colocada em 2015 pelo PS também foi levantada, um ano antes, em 29 de janeiro de 2014, pelo Observatório de Segurança em Meio Escolar (OSME), conforme divulgado pela TSF na peça com o título “Observatório duvida de qualidade de dados sobre violência escolar”, onde era referido que o OSME desconhecia qual a metodologia usada e qual a entidade responsável pelos dados apresentados pelo Ministério da Educação e que falavam sobre uma redução para menos de metade da violência nas escolas, chegando o seu coordenador João Sebastião a afirmar que “se desceu, ou foi por sorte ou por um artifício qualquer estatístico, como má validação dos dados ou então por um conjunto de incidências que possam ter acontecido num ano em particular e ter havido menos ocorrências”.

Também em 2015, um antigo coordenador do OSME, alertava para riscos do “desinteresse político” por esta área, por motivo do Ministério da Educação e Ciência não ter publicado o relatório referente ao ano lectivo 2013/14, dando conta ainda que o na altura Gabinete Coordenador da Segurança Escolar (GCSE) estava sem diretor desde julho desse ano, conforme artigo de 29 de outubro de 2015 publicado no Público com o título “’Desinvestimento total’ do Governo na segurança escolar ‘é perigoso’”.

A mesma preocupação tinha já o Público manifestado, em 13 de abril de 2015, no artigo “Dois terços das participações à polícia vêm das escolas”, onde dava conta, que os dados do RASI 2014 e de anos anteriores, pelo menos desde 2008, mostram uma tendência de crescimento também no número de participações por ofensas corporais, tendo passado de 1.292 em 2008 para 1.665 em 2009, pelo que só os relatórios do Ministério da Educação e Ciência sustentavam um decréscimo da violência escolar, que nem o RASI nem o OSME confirmavam.

O OSME deixou de elaborar relatórios no ano letivo 2011/12, conforme notícia da RTP, de 2 de outubro de 2013, com o titulo “Observatório de Segurança Escolar alerta que dados sobre violência e indisciplina não estão a ser tratados”, onde o coordenador do OSME afirmava que os dados sobre a violência e indisciplina em meio escolar não estavam a ser tratados, porque o último contrato com Ministério da Educação era referente ao ano letivo 2010/11, nunca mais tendo aquele ministério resolvido a situação até hoje.

O OSME continua desativado, tendo no entanto este ano, conforme noticia do JN de 22 de março, 2024 com o titulo “Lançado Observatório para combater indisciplina e “erradicar” violência nas escolas”, ficado a saber que Observatório da Convivência Escolar, composto por diretores, professores, pais e psicólogos, foi criado para diminuir os casos de indisciplina e erradicar a violência nas escolas, tendo como objetivo a criação de uma plataforma de recolha de denúncias, cujo instrumento foi apresentado ao Ministério da Educação

Terminamos, concluindo, que a mais-valia do Programa Escola Segura é indiscutível, no entanto a sua operacionalização, desde 14 de setembro de 1992, em todos estabelecimentos de educação e ensino, públicos, privados e cooperativos, recai apenas nas FS, cabendo a estas unicamente todo o sucesso alcançado, onde a existência de um “Grupo Coordenador”, de uma “Comissão Consultiva” ou de um “Observatório”, nenhuma melhoria visível têm acrescentado, mantendo-se tudo na mesma como há dez anos atrás, nomeadamente no que diz respeito á estatística sobre o fenómeno da violência escolar, pelo que a sua prevenção se torna assim mais difícil, sendo por isso necessário e obrigatório, que as FS articulem entre si a divulgação dos dados, para um melhor esclarecimento da população em geral e da comunidade escolar em particular.

Nota: O texto constitui a opinião exclusiva e única do seu autor, que só a este vincula e não refletem a opinião ou posição da instituição onde presta serviço.


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