Terça-feira, Setembro 23, 2025

InícioOpiniãoA “GUERRA” CONTRA OS INCÊNDIOS RURAIS

A “GUERRA” CONTRA OS INCÊNDIOS RURAIS

Considerando que o combate aos incêndios rurais foi designado recentemente como sendo uma “Guerra”, pretendemos com o presente artigo propor, por isso, a aplicação dos “Princípios da Guerra” ao combate aos incêndios rurais, permitindo dessa forma estruturar as ações de combate, para que sejam mais eficazes, coordenadas e resilientes.

Rogério Copeto

Coronel da GNR, Mestre em Direito e Segurança e Auditor de Segurança Interna

Dirigente da Associação Nacional de Oficiais da Guarda

Os incêndios rurais têm-se tornado, ano após ano, uma ameaça constante às populações, ao ambiente e à economia, pelo que para fazer frente a este “Inimigo” imprevisível, voraz e destrutivo, a abordagem ao seu combate deve integrar estratégias inspiradas em modelos militares, através da aplicação dos “Princípios da Guerra”, que a seguir desenvolvemos, contextualizando-os na luta contra os incêndios rurais.

Princípio do Objetivo: “Toda a operação deve ter um objetivo definido, claro e atingível”, pelo que no combate aos incêndios rurais, o objetivo principal deve ser claro, que é proteger vidas humanas, salvaguardar bens e preservar o património natural, orientando este objetivo todas as decisões operacionais, desde a mobilização de meios até à definição das zonas prioritárias de intervenção, onde a clareza de propósito permite que todas os combatentes estejam alinhados e orientados, evitando dispersão de esforços e aumentando a eficiência do combate.

Princípio da Unidade de Comando: “Uma única autoridade deve coordenar todas as forças para assegurar coesão e ação conjunta”, cuja aplicação no teatro de operações, se consubstancia na existência de um Comando Operacional Unificado, que comanda e coordena todos os agentes de proteção civil, onde se incluem as Corporações de Bombeiros, as Forças de Segurança, as Forças Armadas, as Autarquias e outros agentes que se encontrem no teatro de operações, evitando-se a duplicação de esforços, assegurando que os meios são alocados segundo prioridades reais e minimizando-se o risco de acidentes operacionais por falta de coordenação.

Princípio da Concentração de Forças: “Empregar força superior no ponto decisivo”, através da identificação dos pontos críticos do incêndio, como frentes ativas com potencial destrutivo ou zonas de interface urbano-florestal, e concentrar ali os meios terrestres e aéreos necessários, impedindo esta estratégia a propagação rápida do fogo, protegendo as áreas mais sensíveis e permitindo quebrar o avanço do incêndio com maior eficácia.

Princípio da Surpresa: “Atuar de forma inesperada para o inimigo, ganhando vantagem”, cuja aplicação nos incêndios rurais, em dias críticos, se traduz na ação preventiva e antecipada, através do pré-posicionamento de meios, da “vigilância armada”, do ataque inicial rápido, da gestão dos combustíveis ou dos contrafogos táticos antes da chegada da frente de fogo, reduzindo-se drasticamente o potencial de destruição e permitindo ganhar a iniciativa ao fogo, evitando que este ganhe força incontrolável.

Princípio da Segurança: “Proteger as nossas forças de surpresas ou contra-ataques”, exigindo-se planeamento, formação contínua, comunicação eficaz e equipamentos adequados, onde se inclui também o conhecimento detalhado do teatro de operações e a atualização constante das condições meteorológicas, garantindo que os combatentes não correm riscos desnecessários e que os civis são retirados com antecedência de zonas de perigo.

Princípio da Economia de Meios: “Empregar os recursos com eficiência, sem desperdícios”, através da correta alocação de meios, humanos, materiais e aéreos, utilizando-se cada equipa onde for mais necessária e mantendo reservas para eventuais reacendimentos, evita-se, assim, o esgotamento precoce de recursos e assegura a capacidade de resposta prolongada ao longo de vários dias de combate.

Princípio do Movimento e da Manobra: “Manobrar para obter vantagem sobre o inimigo”, implica que no teatro de operações, as forças sejam reposicionadas rapidamente, mudar a estratégia conforme o comportamento do fogo, abrir caminhos alternativos, com recurso às máquinas de rasto, e usar o relevo a favor das operações, permitindo a capacidade de adaptação respondendo melhor à evolução do incêndio, evitando que este se torne incontrolável.

Princípio do Moral das Tropas: “A motivação e o espírito de corpo são decisivos”, porque sendo o combate aos incêndios rurais uma prova de resistência física e mental, investir no bem-estar, formação, reconhecimento e liderança dos operacionais é fundamental para manter a moral elevada, pelo que combatentes motivados são mais eficazes, coesos e resilientes, mesmo em cenários prolongados e de elevado risco.

Princípio da Logística: “As operações dependem de um sistema logístico eficaz”, pelo que garantir o abastecimento de água, alimentos, combustível, comunicações, abrigo, transporte e descanso é essencial para manter as operações de combate ativas e sustentáveis, permitindo uma boa logística manter o esforço de combate por dias seguidos sem falhas operacionais ou riscos acrescidos.

Concluímos referindo, que combater incêndios rurais não é apenas uma missão técnica, é uma “Guerra” em que o “Inimigo” se move com o vento, se alimenta da vegetação e ataca sem piedade, pelo que aplicar os “Princípios da Guerra” neste contexto significa agir com estratégia, organização e antecipação e que reconhecer que o fogo é um inimigo real, exige uma resposta coordenada, disciplinada e inteligente.

Cada verão que passa reforça a necessidade de planeamento rigoroso e atuação integrada, pelo que a “Guerra” contra os incêndios rurais só será vencida com liderança firme, mobilização coletiva e a aplicação de princípios sólidos, tal como numa verdadeira batalha.

Nota: O texto constitui a opinião exclusiva e única do seu autor, que só a este vincula e não refletem a opinião ou posição da instituição onde presta serviço.

NOTÍCIAS RELACIONADAS

Recentes