Ourique: Acusada de homicídio, septuagenário disse ao juiz,”não falo”.
Lúcida, esclarecedora e incisiva, assim se apresentou ontem no Tribunal de Beja, Maria Bárbara Delfino, 70 anos, a mulher acusada de no ano passado ter matado à bengalada a sua colega de quarto, no Lar da Santa Casa da Misericórdia, em Ourique.
A arguida chorou durante largos minutos antes do julgamento começar. Depois de responder de forma muito assertiva às perguntas sobre a sua identificação, foi célere a dizer ao juiz. “Não falo”, justificou quando questionada sobre os factos contantes no despacho de acusação. No final disse ao juiz: “peço perdão à família da vítima e estou arrependida do que fiz”, acabando por “pedir um favor” ao magistrado. “Dispense-me da leitura da sentença. Estou internada em Coimbra e a deslocação é muito longa até Beja”, o que foi aceite por Vitor Rendeiro.
Procurador do Ministério Público, advogado da família da vítima e advogada de defesa da arguida, todos pediram a condenação da arguida, acusada de homicídio qualificado, mas de acordo com “os meios adequados”, ou seja que o Coletivo de Juízes, presidido por Vitor Rendeiro, tenha em conta que à data dos factos, a mulher sofria de psicose crónica, com sintomas de depressão com instintos homicida e suicida.
O crime ocorreu na noite de 8 de maio de 2016, na sequência de uma discussão iniciada pela septuagenária com a vítima, Mariana Vitória, 86 aos, depois desta ter ofendido a arguida. Maria Bárbara dirigiu-se à colega, que estava deitada, agrediu-a a murro e depois com a bengala da vítima desferiu-lhe vários golpes por todo o copo, nomeadamente no cárneo, de que resultou uma fratura exposta, e que acabaram por lhe originar a morte.
A assistente do lar, o operacional dos Bombeiros de Ourique que foram as primeiras pessoas a chegar junto de Maria Delfino, na noite do crime, esta estava “sentada na cama, a olhar para o nada. Impávida, serena e sem pronunciar uma palavra”, justificaram.
Durante a sentença, o advogado da família da vítima disse que foi apresentada “queixa-crime contra a Direção da Santa Casa da Misericórdia e respetiva Direção Técnica e contra a Médica Psiquiatria do Hospital de Beja”.
Em meados de janeiro, o Lidador Notícias (LN) revelou, que inspetores da Diretoria de Faro da PJ, estiveram no Lar da Santa Casa da Misericórdia, em Ourique, onde fizeram buscas e ouviram algumas pessoas, já que um familiar de Mariana Bárbara tinha apresentado uma queixa, onde procurava implicar e responsabilizar a instituição pela morte da utente.
A arguida está internada no Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra-Pólo Hospital Sobral Cid, onde se encontra em internamento preventivo, depois de ter passado pelo Serviço de Psiquiatria do Hospital de Beja e pelo Estabelecimento Prisional de Odemira, destinado à população feminina.
A leitura do acórdão ficou marcada para o próximo dia 21 de março, e onde se vai ficar a conhecer se o Coletivo de Juízes condena a vítima pelo crime de homicídio ou se a considera inimputável e a interna compulsivamente numa instituição destinada ao tratamento de doentes mentais.
Jorge Mendes (advogado da família da vítima)
“A Direção da Santa Casa da Misericórdia de Ourique e respetiva Direção Técnica e contra a Médica Psiquiatria do Hospital de Beja, negligenciaram uma situação que se sabia de alto risco. As instâncias da Santa Casa tiveram um comportamento grosseiramente negligente, baseado numa lógica monetária e de rentabilização de um espaço, numa situação reprovável e imoral”.
António Joaquim (marido da vítima)
“Isto que a minha mulher fez foi uma grande surpresa. Já tive várias vezes com ela, mas nunca tive conversas a respeito do crime. Desde que está agora internada em Coimbra sinto que está melhor”.
Teixeira Correia
(jornalista)